Há sinais de vida saudável nos ambientes de trabalho; a Comissão do Benzeno é uma das mais promissoras pela atuação de seus integrantes.Há sinais de vida saudável nos ambientes de trabalho; a Comissão do Benzeno é uma das mais promissoras pela atuação de seus integrantes.
Mas aí entram em ação os antídotos: empresas investem mais em prevenção; o trabalhador está mais consciente dos riscos; e os órgãos de fiscalização atuam com maior eficácia, em ações integradas das Delegacias Regionais do Trabalho, Sistema Único de Saúde e Previdência Social.
Teixeira não tem dúvida de que a saúde do trabalhador está, hoje, mais bem controlada: “tudo melhorou em relação ao início dos anos 1990”. Controle é a palavra-chave no enfrentamento de doenças tóxicas, já que não é possível erradicar de vez os agentes causadores delas. A fumaça dos cigarros, as emissões de motores automotivos, os onipresentes postos de gasolina e as indústrias químicas – todos eles são veiculadores do benzeno; os dois primeiros, as maiores fontes de exposição da população.
Atacar os pontos críticos
Danilo Fernandes Costa, médico especializado em medicina do trabalho há 25 anos, cita como significativo o que é feito em indústrias petroquímicas, entre elas a do Pólo do ABC Paulista. O especialista aponta o que considera aspectos relevantes para tornar efetivo esse controle: as empresas devem ter a preocupação de equipar-se melhor, mediante o controle tecnológico, por um lado; e, por outro, tomar cuidados na gestão de seus negócios, para evitar a produção a qualquer custo, sobretudo à saúde do trabalhador.
Na prática, isso significa atacar o que o médico classifica de pontos críticos na fabricação e manuseio de produtos químicos. Por exemplo, providenciar a instalação de filtros de última geração; o bombeamento mais seguro, com o uso de bombas herméticas; e o carregamento por baixo, o “bottom-load”, e não por cima dos caminhões-tanque. Medidas como essas evitam que os vapores nocivos afetem a saúde do operador desses mecanismos e atinjam o meio ambiente. Teixeira diz que o ideal seria substituir o uso do benzeno quando possível (o que foi feito na fabricação do álcool anidro) e adotar medidas de uso responsável, quando for inevitável a sua aplicação. Todo cuidado deve ser devotado à pessoa, que não pode ficar exposta de modo descontrolado ao benzeno (o que se faz nas empresas que produzem, armazenam, estocam ou comercializam a espécie).
Frline Sydneia Abel Arcuri, doutora em Fisicoquímica e pesquisadora da Fundacentro na coordenação do Ministério do Trabalho – setor de agentes químicos, considera que há avanços tecnológicos significativos. Um deles é a citada proibição do uso do benzeno na produção do álcool anidro. E destaca outros, como a diminuição (restrita a 0,1%) de sua aplicação na fabricação de tintas, colas, vernizes e solventes. “A discussão sobre as implicações do uso do benzeno é secular”, ilustra a pesquisadora.
Mesmo assim ainda há resistência de empresas no reconhecimento dos casos de benzenismo em suas unidades. Mas ela comemora o fato de ser crescente o número das que adotam tecnologias de produção mais aprimoradas, como a utilização de bombas, respiros e flanges melhorados. “Há um controle mais rigoroso devido a esses equipamentos, e novas empresas já os utilizam desde o início de suas atividades. Uma conquista da pressão social, resultante de nossos grupos de trabalho”, diz.
João rocha Doutor, técnico de inspeção de equipamentos em empresa manipuladora de benzeno, integra tanto a comissão nacional como a estadual. Mais que isso, é membro também da Comissão Regional da Baixada Santista. Além desta, há regionais no ABC Paulista e Campinas. “Ainda há muita coisa a ser feita, mas o importante é que houve uma melhora significativa da consciência dos trabalhadores na discussão dos problemas que dizem respeito não só ao homem em si, mas ao meio ambiente. nossa visão é do coletivo”, diz.
Benzenismo ou benzolismo é a doença causada na intoxicação por benzeno. As seqüelas são tratáveis, como mostram estudos realizados com grupo de trabalhadores expostos à substância durante quatro anos. Depois de afastados de suas atividades profissionais, recuperaram-se num prazo médio de cinco anos.
Tratamento adequado
Costa afirma que “temos sido bem-sucedidos em restringir o uso do benzeno” (ao se referir aos trabalhos da comissão) e lamenta que outras substâncias, como o amianto, ainda não tenham sido reconhecidas como cancerígenas – o que, comprovadamente, este elemento é. Teixeira demonstra o que se pode definir como otimismo realista: “o trabalhador, hoje em dia, dificilmente terá manifestações clínicas relacionadas à exposição crônica ao benzeno. Isso porque a vigilância à sua saúde é feita, nas empresas, em exames periódicos de dosagens de indicadores biológicos da exposição e exames clínicos e laboratoriais semestrais. uma vez detectada qualquer alteração, o profissional é acompanhado pelo serviço médico da empresa e, quando necessário, é encaminhado a especialistas que auxiliam no diagnóstico e no acompanhamento dos casos”.
Alguns efeitos do benzenismo
– A doença pode ser aguda e causar:
> irritação moderada das mucosas e até provocar edema pulmonar, se aspirado em altas concentrações;
> efeitos tóxicos no sistema nervoso central com possibilidade de narcose e excitação seguida de sonolência, tonturas, cefaléias, náuseas, taquicardia, tremores, convulsões e até morte
– Na fase crônica pode provocar:
> alterações sangüíneas, em que, de- pendendo da lesão da medula óssea, correspondem a:
hipoplasia – pode causar a diminuição da contagem de glóbulos vermelhos e/ou brancos e/ou plaquetas;
displasia – causadora de modificações celulares;
aplasia – correspondente à depressão de todas as linhagens hematológicas, com manifestações de leucopenia, plaquetopenia e anemia
Fórum tripartite e democrático
A Comissão Nacional do Benzeno, resultado de acordo firmado em dezembro de 1995, atua desde 1996. A partir de 1998, foram constituídas as estaduais e as regionais. Fórum tripartite e democrático, privilegia a discussão, negociação e acompanhamento desse acordo.
Dela participam representantes de trabalhadores, governo e empregadores. É coordenada pela Secretaria de Segurança e Saúde no Trabalho, órgão do Ministério do Trabalho. A participação de empregados se dá mediante o Grupo de Representação dos Trabalhadores do Benzeno (GTB), de modo a acompanhar a elaboração, implantação e desenvolvimento do Programa de Prevenção da Exposição Ocupacional ao Benzeno nas empresas.
Em meio a tantos doutores, os trabalhadores também comparecem com o João Doutor, do Sindicato dos Químicos de Santos e Baixada Santista, indicado pela Força Sindical, cita como altamente positivo o fato de terem conseguido ampliar o fórum de debates, a partir dos meados de 1998. Para ele, hoje a participação dos trabalhadores nas plenárias é mais representativa.
Ele cita também o reforço que as discussões ganham com a adesão de mais categorias profissionais. Como a dos “empregados em postos de gasolina, que a partir do Paraná também se mobilizam conosco para discutir os problemas e apontar soluções. Foi até criado um selo, já bem conhecido no meio, sobre os cuidados no trato com o benzeno, que não é flor que se cheire”. Ações como essa, para João Doutor, mostram que “com certeza a evolução da Comissão do Benzeno é fato marcante, e nesse sentido a ampla participação nossa nas discussões é relevante”.
“Inquietude e otimismo”
Teixeira faz a sua avaliação – positiva – do atual estágio desse importante e estratégico grupo de trabalho, que ajudou a criar: “O estado natural da Comissão é a inquietude, sempre procurando onde melhorar, e o otimismo no futuro, lastreado nos avanços obtidos”. Quem ocupa o seu lugar, hoje, na Comissão é Eduardo Sanches, gerente da Quattor e professor universitário.
Arline Arcuri, da Fundacentro, compartilha a inquietude do médico, ao notar que há, na Comissão Nacional, um retrocesso da bancada patronal, que se retirou das plenárias. Essas reuniões têm número significativo de participantes (100 pessoas), com 70% de representantes de trabalhadores. Poderia haver, segundo ela, avanços maiores se o fórum fosse mais democrático, a exemplo do que acontece em São Paulo.
A Comissão paulista, no entender da pesquisadora, tem-se mostrado mais atuante e produtiva, Costa lembra que 1994 foi um divisor de águas, quando se reconheceu o benzeno como cancerígeno e, a partir daí, começou a luta sem tréguas, “No Estado de São Paulo, somos muito atuantes. Não é que não existam problemas, mas eles são enfrentados, e soluções são encontradas. Desenvolvemos programas e atividades de mobilização de empresas, trabalhadores e organismos do governo”, afirma o médico, representante da Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo (DRT-SP) na Comissão paulista e um dos que participaram da criação da Comissão nacional. Nada mais promissor: sinal de que o grupo é atuante e não se acomoda ante os resultados alcançados.