POR – REDAÇÃO NEO MONDO
Este ano, o ECA completou 18 anos de atuação e, embora tenha melhorado o atendimento às crianças e jovens, ainda passa por alterações.
Ao completar a maioridade o jovem passa por um período de transição para a fase adulta, muitas vezes, sem estar maduro para responder por seus próprios atos e cumprir deveres impostos pela legislação a partir de então. No entanto, esta é uma mudança necessária para o seu desenvolvimento e para a garantia de sua estabilidade futura. Do mesmo modo, transitar de uma fase em que a criança e o adolescente eram vistos como seres sem vozes para uma fase em que há uma legislação específica, que rege como a sociedade, a família e o governo devem tratá-los, não é uma tarefa de fácil adaptação, mas importante para a evolução da sociedade.
Mesmo tendo completado 18 anos em vigor, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA ainda enfrenta barreiras na aplicação dos direitos estabelecidos no artigo 4º da lei 8.069/90 referentes à vida, saúde, alimentação, educação, esporte, lazer, profissionalização, cultura, dignidade, respeito, liberdade e convivência familiar e comunitária.
Criação do ECA
De acordo com a presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Conanda, Maria Luiza Oliveira, o Brasil tem um histórico anterior ao estatuto de cinqüenta anos de um código redigido em uma época em que não havia diálogo entre pais e filhos. Fazendo com que a história traçada ao longo desses anos tivesse como base a tutela de desvalorização da identidade do menor, fortalecendo a cultura do descarte e do distanciamento da família, costumes que ainda estão impregnados na atualidade.
Não é difícil encontrarmos crianças e adolescentes sendo criados por familiares longe dos pais, com a alegação de que longe eles poderão ter um futuro melhor. Ou pais que optam por gerar o sentimento de medo nos filhos em detrimento do respeito como forma de impor sua autoridade. Estes, entre outros fatores, criaram um ambiente favorável à concepção de leis que mudassem essa trajetória e oferecessem maior segurança a estes indivíduos. O primeiro passo foi dado, com o estabelecimento do ECA que transformou a criança e o adolescente em agentes ativos da sociedade, exigindo-lhes atenção e cuidado.
No entanto, segundo a presidente, “uma lei não alcança de uma vez só vez a sua totalidade. O Brasil já está avançado neste sentido, aos poucos temos adaptado o estatuto para atender melhor a esta parcela da população. E, embora hoje a criança já seja vista como indivíduo que merece respeito, isso é só o início. Ainda temos muito trabalho“.
Está no papel, mas…
Ainda há uma grande discrepância entre a lei redigida e a aplicada. Um dos fatores que atrapalham sua efetivação é a dificuldade de discutir com os pais a melhor maneira de cuidar dos filhos. “Isto é um desafio, mas vivemos um momento de mais solidez no caminho para ajudar a família a compreender estes cuidados. Estamos buscando potencializar a família em sua capacidade de educar, por isso é importante o envolvimento dos Governos e de instituições na discussão do ECA” – alerta a Maria Luiza.
Hoje já existe maior divulgação da legislação que protege os menores de idade, porém, se há regras, como alertou a presidente, “há quem as quebre”. Enquanto estas brechas não forem solucionadas, milhares de crianças continuarão a ter suas vidas marcadas.
Brechas na rede de assistência
Em setembro deste ano, a população ficou chocada com o caso dos irmãos Igor Giovani e João Victor dos Santos Rodrigues, de 12 e 13 anos, mortos pelo pai e pela madrasta em Ribeirão Pires, no Grande ABC Paulista. Os irmãos já haviam passado cerca de nove meses em um abrigo da cidade por alegação de maus-tratos e abandono, mas foram levados de volta para a casa do pai, onde foram assassinados após algumas semanas do retorno.
Segundo Maria Luiza, esse caso evidencia a necessidade de maior integração da rede de auxílio, com profissionais capacitados que identifiquem qual a real situação de aparência e vivência para o atendimento e acompanhamento desses casos. “É preciso que haja amarra entre as ações dos assistentes sociais, dos conselhos tutelares e da vara da infância, porque se um agir bem, o trabalho do outro não é comprometido e a situação não chega a este ponto” – destaca a presidente.
Outra brecha neste caso, assim como em tantos outros, foi o tempo em que as crianças aguardaram a resolução do caso no abrigo, fato que aumentou ainda mais o distanciamento afetivo. O princípio do ECA é que o melhor lugar para criança e o adolescente crescer é no seio de sua família, de preferência a natural. Caso já tenham se esgotado todas as chances de reaproximação com os responsáveis, o ideal é que sejam encaminhados para a adoção, passando o menor tempo possível em um abrigo, uma vez que, as conseqüências de uma institucionalização prolongada podem ser irreversíveis à criança, criando o sentimento de rejeição, culpa, solidão e dificuldade de relacionamento.
Serviços de acolhimento
De acordo com o resultado de uma pesquisa realizada em 2003 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA: 50,1% das crianças e dos adolescentes foram abrigados por motivos relacionados à pobreza e 24,1% exclusivamente em função da situação de pobreza de suas famílias; 86,7% tinham família, sendo que 58,2% mantinham vínculos familiares, com contato regulares; apenas 43,4% tinham processo na justiça; e somente 10,7% estavam em condição legal de adoção; 20% estavam no serviço há mais de 6 anos. Estes resultados mostraram que grande parte das crianças e adolescentes em situação de abrigo se encontra desta maneira por causa da pobreza em que vive suas famílias.
Como resposta aos resultados dessa pesquisa, foi elaborado um “Plano Nacional de Promoção, Defesa e Garantia do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária” por uma resolução conjunta, formada pelo Conanda, pelo conselho nacional de assistência social, pelo Poder Público e por representantes da sociedade civil. O documento prevê, entre outras adaptações, a excepcionalidade do afastamento do convívio familiar e a provisoriedade do afastamento do convívio familiar de no máximo dois anos.
Já o CNAS abrangeu seu atendimento a famílias de baixa renda, melhorando as condições de proteção às famílias com deficiências, unindo as esferas Federal, estadual e municipal, como afirma a diretora do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, Simone Albuquerque.
Segundo ela, o principal aliado deste trabalho de assistência às famílias tem como principal aliado os Centros de Referência de Assistência Social – CRAS. “Com o CRAS estamos tentando mudar a forma de atingir a assistência social com um sistema de prevenção da violação dos direitos. sua função é encaminhar a população local para as demais políticas públicas e sociais, possibilitando ações intersetoriais” – diz a diretora.
Para a presidente do Conanda, a melhor forma de erradicar os problemas na fase infanto-juvenil é investir na assistência ao adulto, dando a ele condições de trabalho, educação e informação, por isso é importante que essa relação seja intensificada.