POR – ROSENILDO FERREIRA, PARA COALIZÃO VERDE (1 PAPO RETO, CENÁRIO AGRO e NEO MONDO)
Americana Dow e brasileira Boomera se unem para criar resina feita de embalagens recicladas
As ilhas de embalagens e resíduos plásticos que cobrem extensas áreas dos oceanos, ao redor do mundo, se converteram em um verdadeiro libelo contra a imagem da indústria petroquímica global. Afinal, a mesma resina que já foi celebrada como uma inovação industrial, no início do século 20, graças ao trabalho do cientista e empresário belga Leo Hendrik Baekeland, considerado o pai da indústria do plástico, está ajudando a queimar o filme do setor.
É que apesar de ser um componente que não se degrada no meio ambiente, as empresas do setor pouco ou nada fizeram para estruturar, de forma organizada e efetiva, uma rota de reciclagem para este material. E o problema é grave tanto em países ricos, como Estados Unidos e os da Europa Ocidental, quanto em economias emergentes, como Brasil, África do Sul, México e Índia.
Pressionadas por órgãos ambientais, ecologistas e grupos de consumidores as empresas começaram a reagir. Primeiro com o desenvolvimento de resinas produzidas de materiais orgânicos, como a cana de açúcar. Depois, com programas de reciclagem e conversão de embalagens em novos produtos. São dois exemplos nascidos no Brasil. O primeiro foi liderado pela petroquímica baiana Braskem, que desenvolveu o plástico verde, e a indústria de defensivos agrícolas, que criou a inpEV, que faz a reciclagem das embalagens pós-consumo.
É neste contexto que assume um papel diferenciado, o recente anúncio feito pela subsidiária da Dow Brasil para desenvolvimento de uma resina termoplástica a partir de embalagens plásticas recicladas. Para dar conta da tarefa, a potência americana que opera 113 fábricas pelo mundo e fatura US$ 50 bilhões, por ano, se uniu à startup Boomera, baseada em São Paulo e especializada em Economia Circular. Trata-se de um conceito segundo o qual o ciclo de vida do produto deve ser levado em conta ainda no estágio de sua concepção, na prancheta do design.
“Os resíduos gerados por nossos produtos é um problema nosso e cabe a nós resolvermos”, diz Carolina Mantilla, diretora de sustentabilidade do negócio de plásticos da Dow para América Latina. Segundo ela, ao enfrentar a questão de forma inovadora, a empresa pretende mostrar que a sustentabilidade é um componente estratégico para o negócio.
Carolina Mantilla, diretora de sustentabilidade Dow para a América Latina
O acordo prevê investimentos em torno de R$ 1,5 milhão até o final do ano. Os recursos estão sendo gastos na aquisição de equipamentos, além da montagem de uma unidade de reciclagem da Boomera, em Santo André (SP). Hoje, a startup já opera plantas industriais em Cambé (PR) e Diadema (SP). “As poliolefinas devem se tornar o novo alumínio do setor de reciclagem”, aposta Guilherme Brammer, fundador e CEO da empresa, referindo-se ao fato de o Brasil ser o maior reciclador de alumínio do planeta, com índice de 98%.
Segundo ele, já existe demanda para reciclagem de diversos tipos de plásticos, especialmente as garrafas PET. Contudo, o que falta é uma cadeia de valor que opere de forma circular, estruturando desde o recolhimento, a separação, o processamento e a reciclagem da resina. É nesta etapa que se mostra estratégica a parceria com a Dow, que detém recursos para investir, tecnologia e capacidade de distribuição.
A expectativa da diretora de sustentabilidade da gigante americana é apresentar ao mercado uma resina capaz de ser incorporada a produção de embalagens em diversos setores. Na prática, seria um concorrente ao plástico verde, da Braskem. “Acreditamos que nenhum resíduo, especialmente o plástico, deve terminar no meio ambiente”, destaca.
A motivação ecológica é importante, mas o projeto está se desenvolvendo sob a ótica de negócios. E não seria diferente, afinal, a divisão de embalagens plásticas responde por metade das receitas globais da Dow, em nível mundial.
Política de Resíduos Sólidos
O ativismo da Dow chega num momento em que a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), aprovada em 2010, enfrenta oposições de todos os lados. A começar dos prefeitos que alegam não ter recursos para implementar os dispositivos legais previstos na legislação. O principal deles se refere ao fechamento dos lixões e aterros irregulares, que deveriam ter deixado de existir em 2014.
Pelas contas da Associação Brasileira de Limpeza Urbana e Resíduos Especiais (Ablelpe), ainda estão e operação 2.976 lixões, espalhados por 45% dos municípios. Nestes locais foram depositados 12,9 milhões de toneladas, em 2017. Além de degradar o meio ambiente, a existência destes espaços causa inúmeros danos à saúde. De acordo com Carlos Silva Filho, presidente da Abrelpe, os gastos com saúde resultantes de problemas ligados à resíduos chega a R$ 2 bilhões, por ano.
A parceria entre a Dow e Boomera deseja atacar a questão dos resíduos sólidos, no Brasil, pelo lado da inovação e lançando mão da tecnologia. Sem a pretensão de resolver o problema, mas com a preocupação de dar uma contribuição relevante. Sem descuidar dos negócios, claro.
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