POR – SUCENA SHKRADA RESK* (350.ORG BRASIL) / NEO MONDO
Relatório analisa que planos a contratos no setor podem inviabilizar o Acordo de Paris, que será discutido na Conferência do Clima, em dezembro, em Madri
Como chegar ao limite seguro de aumento da temperatura média do planeta em 1,5º C até o final do século em comparação com os níveis pré-industriais, em um mundo que ainda tem significativos investimentos atuais e futuros na produção de carvão, petróleo e gás natural? O relatório inédito Production Gap Report lançado, nesta semana, pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) dá a seguinte resposta: a conta não fecha até o ano de 2030 – bem antes do que se imagina -, com uma produção fóssil na ordem de 39 GtCO2, que trocando em miúdos, significa 21GtCO2 ou 120% a mais do que é necessário para estabilizar o limite para 1,5°C. (veja também Entenda o que está em jogo com o limite da temperatura média do planeta em 1.5º C até o final do século)
Foram analisados os planos, produções e perspectivas principalmente em dez países-chave. Sete deles são hoje considerados principais produtores de combustíveis fósseis: China, Estados Unidos, Rússia, Índia, Austrália, Indonésia e Canadá e três são produtores importantes com ambições climáticas fortemente declaradas -Alemanha, Noruega e Reino Unido. Também há análises adicionais Brasil, Argentina, México e Cazaquistão, além de países árabes, africanos e do cone-sul que completam a lista dos 27 maiores produtores de combustíveis fósseis no mundo.
A situação chega a ser tão emergente, que quando se trata do carvão, os percentuais de excesso apresentados, para o período, são mais alarmantes. Seriam de 280% (6,4 bilhões de toneladas) acima da meta para atingir o limite de 1,5º C, de acordo com o relatório.
Hoje a China é o maior produtor mundial de carvão, respondendo por quase metade (43%) da produção global em 2017 (3159 de 7320 milhões de toneladas, ou Mt) e sétima no mundo em produção de petróleo. Seu mais recente Plano Quinquenal incentiva a expansão de exploração e extração doméstica de petróleo, e continua a subsidiar o mercado interno produção de carvão. O relatório também destaca que os governos central e provincial chineses fornecem mais de uma dúzia de subsídios para produção de carvão e metano no leito de carvão incluindo desoneração fiscal, investimento direto, apoio à pesquisa e desenvolvimento.
Qual é a importância desta informação para a humanidade? A proximidade do aumento do comprometimento do bem-estar da vida no planeta com relação às mudanças climáticas e ao Aquecimento Global. Este cenário coloca em xeque um dos principais objetivos do Acordo de Paris, de 2015, que está em andamento e será discutido na Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP-25), em dezembro, em Madri, na Espanha. Neste ambiente, com a participação de quase lideranças de 200 países, é decidido, de certa forma, como será o planeta que deixaremos para as próximas gerações.
O documento frisa que embora carvão, petróleo e gás sejam os principais impulsionadores da mudança climática, eles são raramente objeto de políticas e negociações internacionais sobre clima. O relatório, neste sentido, visa expandir esse discurso e fornecer uma métrica para avaliar a que distância o mundo está dos níveis de produção consistente com os objetivos climáticos globais.
De acordo com o relatório, muitos países parecem estar apostando nos mercados de exportação para justificar grandes aumentos na produção e cita como exemplo, EUA, Rússia e Canadá. Por outro lado, outros buscam limitar ou acabar com as importações por meio da produção em grande escala. Neste caso, China e Índia. Com isso, o resultado líquido poderia ser um investimento excessivo significativo, aumentando o risco de ativos ociosos, também em relação a trabalhadores e comunidades, e impulsionando a alta das emissões de GEEs.
O que fica evidente é que as principais nações poluidoras não estão correspondendo a um discurso de uma economia de baixo carbono, com menos emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs). E o Brasil entra nesta constatação de desequilíbrio, que se acentua com o anúncio feito após os leilões de concessões de áreas para a exploração do Pré-sal recentemente. No relatório, aponta a projeção de 5,6 milhões barris/dia de petróleo, sendo que o ‘tolerável” deveria ser no máximo 4,3 mi. No caso do gás, a projeção do país em 49 bilhões de m3/yr é 10 bi a mais do que seria “tolerável’ para atingir o 1.5ºC.
Neste cenário, uma verdade, que se pode dizer ‘inconveniente’, é exposta no relatório Production Gap Report:
“De fato, embora muitos governos planejem diminuir suas emissões, estão sinalizando o oposto quando se trata da produção de combustíveis fósseis, com planos e projeções para expansão. Isso dificulta a capacidade coletiva dos países para cumprir as metas climáticas globais, além de ampliar não apenas a diferença de produção, mas também a diferença de emissões”
Para chegar neste resultado, foram analisados planos, projeções, projetos e contratos mundiais em combustíveis fósseis no período. O levantamento foi feito em parceria com o Stockholm Environment Institute, o International Institute for Sustainable Development, o Overseas Development Institute e o CICERO-Centre for International Climate and Environmental Research and Climate Analytics.
*Sucena Shkrada Resk – jornalista ambiental, especialista em política internacional, e meio ambiente e sociedade, é digital organizer da 350.org no Brasil.