Missão Europeia visita o território do Alto Rio Pardo. Foto: Guilherme Larsen/PNUD Brasil
POR – ONU / NEO MONDO
O beneficiamento das espécies do Cerrado tem transformado a vida de centenas de famílias no norte de Minas Gerais. Acompanhar e conferir este e outros resultados do projeto Bem Diverso foi o objetivo de missão realizada este mês, que percorreu municípios que abrigam as atividades da iniciativa
O Bem Diverso é fruto da parceria entre Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com recursos do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF). A execução é feita em parceria com organizações do governo e da sociedade civil.
Polpas de fruta lotavam os freezers da pequena agroindústria da comunidade Água Boa II, enquanto uma comitiva de pesquisadores estrangeiros, além de técnicos e parceiros do Projeto Bem Diverso usavam tocas higiênicas para acompanhar cada um dos processos – desde a lavagem da fruta até o empacotamento e rotulagem do produto. O beneficiamento das espécies do Cerrado tem transformado a vida de centenas de famílias na região.
Acompanhar e conferir este e outros resultados da atuação do projeto no território foi o objetivo da missão, que aconteceu no início de março e percorreu municípios que abrigam as atividades do Bem Diverso no território do Alto Rio Pardo, ao norte de Minas Gerais.
O Projeto Diálogos Setoriais viabilizou a troca de experiências entre pesquisadores brasileiros e europeus, promovido pela União Europeia, Ministério da Economia, Ministério das Relações Exteriores e pelo Projeto Bem Diverso (PNUD/GEF/EMBRAPA).
A primeira parada da comitiva foi o Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas, a Cooperativa Grande Sertão e a Área de Experimentação e Formação em Agroecologia, em Montes Claros. De acordo com coordenador da Área de Experimentação e Formação em Agroecologia, Álvaro Carrara, “os produtos da sociobiodiversidade são processados dentro de um sistema que, além de gerar renda e garantir a segurança alimentar das comunidades rurais, conserva e preserva o Cerrado e a Caatinga, recupera nascentes e áreas degradadas, forma guardiões de sementes nativas e capacita e encoraja os jovens a permanecerem e viverem dos bens da terra”.
Foto – かねのり 三浦 por Pixabay
Educação no campo
Na Escola Família Agrícola Nova Esperança (EFA), em Taiobeiras, foi a vez de comprovar o fortalecimento das tradições e técnicas rurais passadas a jovens em curso técnico inserido na grade do ensino médio. Eles aprendem tecnologias sustentáveis para empregar nas comunidades em que vivem. Para o diretor da escola, Josimar Almeida, muitos jovens vão perdendo a identidade com o campo, achando que a roça e a produção de alimentos não são importantes. “A EFA Nova Esperança nasceu contra esse movimento, porque a educação no campo é um direito”, explicou o diretor.
Na avaliação do cientista da Luke Natural Resources Institute Finland, Mikko Kurttila, o projeto é bem estruturado e está ajudando as comunidades desenvolverem suas atividades em bases sustentáveis. “Isso é excelente. O que eu aprendi com o Projeto Bem Diverso no Brasil é fazer o uso da biodiversidade priorizando a conservação, enquanto na Finlândia nós não usamos a biodiversidade, a preocupação é apenas preservar”, comentou o cientista.
Vivenciando a cultura local
Em todos os lugares onde passou, a comitiva teve a oportunidade de provar alimentos à base de espécies locais, tanto in natura – como o pequi, a cagaita, o araticum – até os já beneficiados e com valor agregado, como o café especial sombreado Cacunda de Librina, produzido em Sistemas Agro-florestais (SAFs) na comunidade Vereda Funda, em Rio Pardo de Minas, a cerveja artesanal de coquinho azedo da Grande Sertão; e ainda as polpas das inúmeras frutas do Cerrado produzidas pela Cooperativa de Agricultores Agroextrativistas de Água Boa II (COOPAAB).
O grupo acompanhou o trabalho dos coletores e restauradores do Cerrado na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Nascentes Geraizeiras (Alto Rio Pardo) que contaram, com muito orgulho, como o projeto os incentiva a recuperar o bioma e os meios de vida das comunidades locais. Segundo a jovem restauradora Fabrícia Santarém, o uso sustentável do Cerrado vem mudando a geração de renda da comunidade. “O trabalho contribui para a valorização das raízes locais e a permanência dos jovens no campo” explicou a restauradora.
A comitiva foi recebida por um grupo de seresteiros com a tradicional Folia de Reis e Catira – dança folclórica regional.
De acordo com o Conselheiro da Delegação da União Europeia no Brasil, Rui Ludovino, o Projeto Bem Diverso contribui com a manutenção da biodiversidade de forma inclusiva. “O projeto contribui para o enfrentamento da mudança global do clima e da crise ecológica. É preciso corroborar para o grande pacto verde estipulado globalmente”, complementou.
Foto – annca por Pixabay
Consolidando parcerias
Para o professor de agribusiness da Hochschule Rhein-Waal University of Applied Sciences na Alemanha, Dietrich Darr, e para Wageningen University & Research da Holanda, Verina Ingram, agora é o momento de consolidar os produtos com investimento em crédito e em estratégias de marketing para que possam manter a sustentabilidade da cadeia se tornando mais atraentes, e, assim, ter acesso a crédito para alcançarem o mercado (nacional e internacional). “Estamos aqui para discutir com nossos colegas pesquisadores da Embrapa como podemos trabalhar juntos nessas questões”, explicou o professor alemão.
A pesquisadora Verina verificou que a forma com que a comunidade clama por suas terras e emprega o desenvolvimento sustentável é parecido com algumas populações que ela acompanha onde mora, em Camarões, na África. “Agora vejo a necessidade de investidores para os negócios e marketing para ajudar a manter a sustentabilidade da cadeia, desde a produção até chegar nos consumidores”, acrescentou a pesquisadora.
Para o assessor técnico do PNUD, Fernando Moretti, a estratégia do Seminário Internacional em Brasília e da Missão de Campo foi mostrar que o conhecimento acumulado tanto pelo Bem Diverso quanto pelas experiências compartilhadas pelos pesquisadores e professores europeus serviu para identificar possibilidades de colaboração e cooperação técnica entre os vários atores envolvidos. “A parceria entre os Projetos Diálogos Setoriais e Bem Diverso se mostrou bastante rica na promoção do intercâmbio de conhecimentos entre as diversas experiências nas áreas de extrativismo e conservação pelo uso sustentável, e agora trabalharemos para que esta parceria siga profícua, seja através de novos editais, pesquisas ou mesmo projetos”, afirmou o assessor técnico do PNUD.
O coordenador do Projeto Bem Diverso e pesquisador da Embrapa, Anderson Sevilha, explicou que os próximos passos estarão relacionados à formalização das parcerias institucionais com a Embrapa, o Bem Diverso, instituições e universidades envolvidas no Diálogos Setoriais. O que significa, na prática, escrever projetos para buscar recursos e dar continuidade ao trabalho em campo executado no território.
“A troca de experiências começou entre os pesquisadores, mas a ideia é que se amplie com o intercâmbio de estudantes, agricultores, extensionistas brasileiros e europeus, para que conheçam as diferentes realidades”, afirmou o coordenador. Um ponto foi marcante em todas as falas: o complemento que o projeto traz em relação à pesquisa, já que o Bem Diverso é um projeto de desenvolvimento. A nossa capacidade de trazer a pesquisa voltada para o desenvolvimento local dessas comunidades chamou a atenção dos estrangeiros”, finalizou o coordenador do Projeto Bem Diverso.