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ARTIGO
POR – JULIA FONTELES*, ESPECIAL PARA NEO MONDO
Sem plano de descarbonização, país caminha para o isolamento mundial
No último ano, três das maiores economias mundiais anunciaram seu plano de descarbonização. China, Japão, Reino Unido – em breve os Estados Unidos se integrarão ao grupo –, se juntaram a União Europeia e se comprometeram a aderir a planos de descarbonização, conhecidos como Green Deals, e atingir neutralidade de carbono até 2050. Índia e Coreia do Sul seguem em dia com seus compromissos do acordo de Paris e a estratégia de diminuir a emissão de carbono. Até a Rússia, conhecida por suas extensas reservas de petróleo e gás, divulgou um plano em março deste ano para diversificar energia até 2050. De todos os BRICS, o único país ainda sem um plano complementar de descarbonização é o Brasil.
Vale ressaltar que o Brasil é o país com a matriz energética mais limpa dos BRICS, mas o setor automobilístico e o alto nível de desmatamento ainda o deixa na 7ª posição dos países que mais emitem gases do efeito estufa (GEE). O atual descompromisso do país com a agenda climática global mostra isolamento e atraso e pode prejudicar o desenvolvimento econômico a curto e longo prazo.
O Green Deal da União Europeia inclui um mecanismo de controle de fronteiras, cujo objetivo é traçar a cadeia de produção de tudo que entra ou sai do continente. O vice presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, diz que a iniciativa procura incentivar outros países a turbinar seus planos climáticos. Na prática, isso significa que aqueles com regulamentos flexíveis sob emissão de carbono e outros gases poluentes vão ser excluídos de acordos comerciais e isolados da comunidade internacional. O presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, já deu sinais de que vai adotar um sistema parecido como estratégia comercial. À medida que mais países aderem a essa prática, o mercado brasileiro fica cada vez mais isolado.
O setor privado já sofre com as consequências da negligência do governo Bolsonaro sobre exigências de políticas que controlam o desmatamento. Em carta enviada ao vice presidente Hamilton Mourão em julho, 38 empresários expressam preocupação com os baixos níveis de investimentos e convidam o governo a impor controles de emissão, especificamente com relação ao desmatamento.
Além da economia, o Brasil tende a perder sua posição de liderança ou a possibilidade de entrar em organizações internacionais. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), por exemplo, sonho de consumo do Brasil há algum tempo, em poucos anos deve incluir um requerimento de descarbonização. Financiamentos do Banco Mundial, Fundo Monetário e BID devem seguir o mesmo caminho, o que dificultará a pontuação de crédito do país, junto com todos os outros indicadores, incluindo o Ease of Doing Business Index.
Com Biden no governo norte-americano, o Brasil poderia se beneficiar de uma parceria continental e um plano gradual de atingir neutralidade de carbono até antes de 2050. Inclusive, ao apostar numa matriz de energia limpa, o foco do país deveria estar no combate e aumento da fiscalização do desmatamento da Amazônia e em planos de reflorestamento, assim como está sendo feito na Europa e na Indonésia. Um plano integrado de reconstrução da infraestrutura do setor automobilístico, parecido com o do primeiro ministro britânico Boris Johnson representa uma oportunidade de criar novos empregos e apaziguar a crise econômica.
A combinação da crise climática com a pandemia da covid-19 representa um momento histórico e definitivo na formação de parcerias globais e divisores geopolíticos. Sem um plano climático que envolva todos os setores da economia, o Brasil se coloca numa posição extremamente desfavorável e com pouco prestígio. Antes pioneiro em assuntos sobre biodiversidade, é lamentável ver o retrocesso do país, que se encontra mais isolado na agenda mundial a cada dia.