Dryades concinna – Itacaré – Bahia ( 1ª e 2ª foto) e Dryades gaudichaudiana – Guapimirim – Rio de Janeiro – Foto: Milton Groppo
POR – TAINÁ LOURENÇO (JORNAL DA USP) / NEO MONDO
Nome dado por cientistas de Ribeirão Preto a um grupo de cinco arbustos e árvores endêmicos da Mata Atlântica é inspirado nas Dríades, as ninfas da floresta da mitologia
A família das laranjas, tangerinas e limões, conhecida como Rutaceae, ganhou um novo membro: o gênero Dryades. Esse nome, dado a um grupo de cinco arbustos e árvores endêmicos da Mata Atlântica, foi identificado em um estudo liderado pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP e é inspirado nas ninfas das florestas, presentes nos mitos da Grécia Antiga.
O novo gênero inclui as espécies Dryades concinna, Dryades cyrtantha, Dryades gaudichaudiana, Dryades hirsuta e Dryades insignis, que acreditava-se pertencerem ao gênero Conchocarpus, um dos maiores grupos da família Rutaceae, com cerca de 50 espécies, distribuídas da América Central ao Sul do Brasil.
O professor Milton Groppo, do Departamento de Biologia da FFCLRP, líder do estudo, conta que esse tipo de mudança é muito comum pois no passado os seres vivos eram classificados de acordo com semelhanças em características morfológicas que não refletem necessariamente a história evolutiva dos grupos. Análises mais modernas com dados moleculares (especialmente DNA) têm sido usadas na inferência do parentesco entre as espécies.
Foi justamente por causa das características morfológicas que os cientistas acreditavam que as cinco espécies do estudo de Groppo pertenciam ao gênero Conchocarpus. Entretanto, análises do DNA de membros desse grupo mostraram que, na verdade, elas possuem características genéticas diferentes das outras nomeadas como Conchocarpus. Por isso, conta o professor, “tivemos que escolher um novo nome e passar as espécies diferentes para esse novo gênero, que é o Dryades”.
Os cientistas propõem novos nomes quando encontram espécies que não se encaixam em nenhum outro grupo já nomeado, como no caso das espécies Dryades. Groppo diz que o desafio é “entender a evolução dos grupos atuais e aqueles já extintos, nomeando estes grupos de modo que a história evolutiva dos organismos seja refletida nas classificações biológicas”.
Novos achados colaboram na preservação das espécies
Os cientistas propõem novos nomes quando encontram espécies que não se encaixam em nenhum outro grupo já nomeado, como no caso das espécies Dryades
Assim como na Grécia Antiga as ninfas dríades protegem as florestas, no Brasil as Dryades colaboram com a preservação de seu habitat natural. Segundo o professor Groppo, a partir do DNA é possível estudar a história evolutiva das plantas e, assim, compreender como foi a ocupação e formação dos ambientes nos quais esses organismos estão inseridos. Além disso, conta, a identificação de novas linhagens “pode ser utilizada pelos pesquisadores para propor áreas de conservação de espécies, tanto de animais quanto vegetais”.
No caso do novo gênero, duas espécies podem ser salvas da extinção: Dryades concinna e Dryades hirsuta, plantas que estão presentes em apenas uma região do sul da Bahia, nas cidades de Itacaré e Ilhéus, respectivamente. Groppo explica que, além da manutenção dos ecossistemas, a preservação permite salvar áreas de grande diversidade genética, locais fonte de potenciais moléculas utilizadas pela indústria farmacêutica na produção de insumos para a saúde humana.
“Plantas não melhoradas geneticamente, como estas do gênero Dryades, podem conter princípios ativos com potencial de utilização como defensivos agrícolas naturais, pois podem fornecer genes para plantas cultivadas que passam a ser mais resistentes às pragas ou ainda genes que poderiam aumentar a produtividade. As linhagens de batatas selvagens dos Andes são um bom exemplo de plantas utilizadas no melhoramento genético da batata que consumimos”, conta o professor.
Homenagem à expedição de Von Martius
Essa não é a primeira vez em que as Dríades dos contos gregos aparecem em solo brasileiro. O novo gênero da família Rutaceae também é uma referência ao nome dado ao domínio da Mata Atlântica pelo botânico alemão Carl Friedrich Philipp von Martius, durante suas expedições pelo Brasil. A escolha de Dryades celebra os 201 anos do final dessa viagem, parte da Missão Austríaca que explorou o Brasil no século XIX. Martius e seu colega naturalista Johann Baptist von Spix percorreram, entre 1817 e 1820, mais de 10 mil quilômetros, com achados que trouxeram descobertas para as áreas de botânica, zoologia e etnografia.
Além de Dríades como nome para a Mata Atlântica, o pesquisador alemão se inspirou na mitologia grega para nomear as regiões fitogeográficas do Brasil e homenageou outras ninfas, como as Oréades, nos Cerrados do Brasil Central, as Náiades, na Amazônia, as Hamadríades, na Caatinga, e as Napeias, nas florestas de araucária no Sul do País.
O estudo Uma ninfa das árvores da Mata Atlântica brasileira; Dryades (Galipeinae, Rutaceae), um novo gênero neotropical segregado de Conchocarpus, publicado na revista Molecular Phylogenetics and Evolution, faz parte de uma grande pesquisa que tem sido conduzida pelo professor Groppo com as Rutaceae neotropicais, no Laboratório de Sistemática de Plantas do Departamento de Biologia da FFCLRP, com a participação de alunos e pesquisadores brasileiros e estrangeiros.
O estudo é financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).