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POR – MARIANNA ARAUJO, DIRETORA DE COMUNICAÇÃO THE INTERCEPT BRASIL / NEO MONDO
Três notícias das últimas 72h:
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Batemos o recorde mundial de mortes por covid-19 em um único dia.
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Mais de 100 milhões de brasileiros vivem atualmente em situação de insegurança alimentar.
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A Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei “fura-fila” das vacinas, autorizando empresas a concorrer com o poder público pela aquisição de doses, em prejuízo de uma vacinação justa.
Ontem, 4.211 brasileiros morreram por conta do novo coronavírus. Somente os Estados Unidos já tinham registrado mais de 4 mil vítimas em um único dia. Foi em janeiro, quando morreram 4.476 mortes. De lá pra cá muita coisa mudou, o país acelerou a vacinação e já enxerga uma luz no fim do túnel.
A situação brasileira é exatamente oposta. Nada indica que chegamos ao topo. Alguns especialistas apontam que em breve vamos ultrapassar a marca dos 5 mil mortos por dia. Sim, porque a pandemia não se resolve sozinha. É preciso adotar medidas de prevenção, de controle da circulação do vírus e, o óbvio, vacinar massivamente. Tudo aquilo que o governo de extrema direita liderado por um ex-capitão incapaz e seus generais que topam tudo pelo poder não fez.
Mas o brasileiro não está morrendo só de covid-19. Está morrendo também de fome! Soubemos na segunda, por conta de uma pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, que atualmente 116 milhões de brasileiros vivem em situação de insegurança alimentar. Mais da metade da população convive com a fome. Esta é a maior taxa em 17 anos.
A tragédia brasileira não é só política, alimentar, sanitária. Ela é, especialmente, social. A elite econômica nacional jamais perde a chance de demonstrar que nada abala seus privilégios e que não há crise que a comova. Claro, sempre tendo o núcleo fisiológico da política a seu serviço e operando na defesa dos seus interesses. Mesmo com a imensa quantidade de mortes e com a vergonha global que passamos no momento, sendo apontados nos quatro canto da Terra como um criadouro de vírus, a Câmara dos Deputados achou que era hora de aprovar um projeto que permite que empresas adquiram vacinas, sem a obrigação de doar todas as doses para o SUS. Seria um escárnio se não fosse mais uma face da política da morte.
Na prática, o Brasil fez algo inédito: legalizou a concorrência interna por vacinas no momento em que há uma fila mundial por imunizantes. É exatamente porque isso é um absurdo e uma prática desumana que os grandes laboratórios vendem só para governos.
Bom, se as farmacêuticas não vendem para empresas privadas, como então elas pretendem adquirir doses? Acredite, há uma outra iniciativa sendo articulada para que o Ministério da Saúde compre vacinas no lugar dessas empresas, use metade no SUS e repasse a outra metade para os empresários que pagaram pelas doses. Novamente seremos um caso único do mundo: um país onde o governo topa ser laranja de empresário.
Não há mesmo luz no fim do nosso túnel. Mas este é exatamente o momento em que não podemos parar. Há muitas tarefas pela frente para tentar reverter o que ainda pode ser revertido, pressionar quem deve ser pressionado e fazer um tremendo esforço social e político para sairmos dessa. Não há outro caminho. Foi assim, sob pressão da sociedade, que o auxílio emergencial ajudou milhões de brasileiros. Foi assim também que Bolsonaro acumulou pequenas derrotas ao longo dos últimos dois anos.
Esta mensagem é para te dizer que o Intercept está totalmente dedicado a trabalhar para contribuir com esse esforço coletivo. No que depender da nossa redação, seremos parte daquele grupo de brasileiros que quer virar o jogo da fome e da política da morte. Nós sabemos que a contribuição que podemos dar neste momento é investigar Bolsonaro e sua família, fazer reportagens que ajudem a sociedade a pressionar o Congresso Nacional por uma vacinação justa, denunciar a hipocrisia e a negligência dos mais ricos.
Nós temos os meios para fazer isso e você sabe do que somos capazes. Peço que acompanhe nossa cobertura bem de perto nos próximos dias, compartilhe,, nos mande sugestões, comentários. E se, assim como a gente, você está com temor do futuro e sem saber o que fazer, aqui vai uma sugestão: junte-se aos milhares de brasileiros que fazem o TIB. É muito animador fazer parte de algo assim, eu garanto.