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ARTIGO
POR – ELLEN CARBONARI*, ESPECIAL PARA NEO MONDO
A construção de uma nova organização social, mais equilibrada, justa e que regenere a vida das pessoas e do planeta, dialoga com a identificação de um propósito que transborda a existência individual. É a busca coletiva por um lugar no qual os desejos particulares nutrem um objetivo comum. As florestas são as grandes mestras para quem quiser pensar na regeneração de ecossistemas, ou mesmo na criação de um. Aqui dialogo com os líderes de todas as verticais: um ecossistema de inovação tem o potencial de transformar uma região e essa transformação significa vidas mais ricas no sentido material e imaterial, ou seja, alimentos na mesa, acesso à água potável, moradia, educação, cultura e tantas outras condições básicas para viver. Como já falamos por aqui, a inovação é um processo que mitiga riscos e é um importante instrumento na descoberta de novos e melhores jeitos de fazer; um fazer social, econômico e político integrado.
Criar e fomentar um ecossistema de inovação próspero é para qualquer ser que entende que a vida importa e o jeito como vivemos é como honramos essa vida. Foi pensando em florestas e na conexão humana que Victor W. Hang, investidor no Vale do Silício, empreendedor serial, diretor executivo da Global innovation Summit e colunista da Forbes desenvolveu um modelo de ecossistemas baseado nos ensinamentos da floresta, nos sistemas naturais e vivos que se desenvolvem pelo não esperado, pelas mudanças e pelas incontáveis interações entre fauna e flora. As interações entre os seres humanos seriam, nesta linha, como um ecossistema florestal e o desenvolvimento próspero depende das interações de pessoas que possuem talento, capital ou ideias. Ou seja, todos nós.
Diferente de um sistema industrial, baseado na previsibilidade e produtividade para produzir bens confiáveis e de acesso massificado, a inovação cresce em ambientes aparentemente caóticos; estes ambientes são fortemente beneficiados pela cultura, algo que os economistas passaram a identificar como uma alavanca econômica que define a forma como fazemos o que fazemos. Em um ecossistema de inovação, a cultura ajuda a compreender como investimos, e isso é tão importante quanto compreender onde e quando o fazemos. Nesta investigação, entende-se que uma cultura com potencial de fomentar ecossistemas baseia-se primeiro na confiança que, para Hang, se traduz em crescimento.
O que define confiança são nossas ações e interações. Desde a revolução industrial carregamos o entendimento de que “trabalho é trabalho” e a vida se desenvolve fora deste; não poderíamos estar mais errados. O que fazemos importa e, assim, toda ação carrega em si um potencial de impacto e, portanto, de transformação. Hang nos ensina ao analisar ecossistemas de inovação que não são apenas as variáveis clássicas da economia (capital, trabalho, terra) os motores da inovação, mas os padrões comportamentais em níveis individuais. Como as pessoas interagem influencia o nível macro do ecossistema.
Floresta da Tijuca – Foto: Divulgação
Refundar um ecossistema vivo para um fixado na prosperidade material e imaterial de todos os organismos envolvidos requer a vivência de três aspectos cíclicos e naturais: plantar, cultivar e nutrir. Cada uma dessas etapas exige do articulador de ecossistemas habilidades para que hora as pessoas possam entrar em um fluxo criativo de ideias e em contato com o incerto, hora possam transformar as melhores ideias em planos de ação e aprendizagem constante e na sequência possam mensurar e redefinir atributos do ecossistema. Apenas para começar tudo novamente, a partir de um novo e melhor lugar. Esses atributos, entretanto, estão mais alinhados aos aspectos sutis do ecossistema do que aos aspectos objetivos – e aqui reside um importante desafio, a mensuração da confiança entre as relações humanas, a alegria, a abertura ao erro.
Ao plantar novas ideias para que um ecossistema floresça é preciso criar um ambiente em que as barreiras entre os atores sejam minimizadas – isto diz respeito a espaços físicos e interativos, clareza de contratos e identificação de padrões sociais e psicológicos, como medos, vieses cognitivos e crenças que podem conter a ação das pessoas. É preciso organizar uma cultura em que as pessoas se sintam atraídas pela ideia de sair da zona de conforto – e nesse sentido, representatividade e lideranças importam. Aliás, lideranças colaborativas e assertivas são fundamentais em todas as partes do processo, não como gurus mas guias que já abriram alguns caminhos e podem acenar erros e atalhos.
Após criar um ambiente rico para que novas, diversas e sustentáveis ideias surjam, entra-se na fase de cultivo. O cultivo requer reflexão, ações direcionadas e marcos de chegada concretos para validar ou invalidar projetos. Esses marcos podem ser melhor alcançados quando quebramos as coisas grandes em pequenas, incentivamos o feedback constante e o aprender fazendo. Esses mecanismos auxiliam na correção de rotas de forma rápida, o que mitiga risco.
Finalmente é a hora de nutrir os novos projetos e mensurar o sucesso. Mas aqui entra a parte difícil – o sucesso é medido pelo sutil, por aquelas coisas invisíveis, mas que nutrem um ecossistema como a diversidade, a confiança, a abertura ao feedback, os contratos sociais do ecossistema. Neste terceiro momento entende-se quais são os sonhos coletivos que devem ser preservados ou como os caminhos individuais dialogam com a ação coletiva. É um processo árduo de perceber-se como parte do todo e romper com a lógica da divisão e do indivíduo para transbordar com o coletivo.
Ao pensar e agir nesta lógica ecossistêmica, ganha-se clareza sobre o lugar a chegar, mas trabalha-se de forma dialética com o meio, aprendendo, tomando riscos e analisando o objeto de interação a todo instante. Este processo todo não é tão diferente assim do processo de viver, empreender e pensar a sociedade.Justamente por isso já o conhecemos e estamos, portanto, habilitados para assim o fazer.