Imagem – Pixabay
ARTIGO
POR – VIRGILIO GIBBON*, PARA NEO MONDO
Raramente um país tem a oportunidade de defender seus próprios interesses e, ao mesmo tempo, propor soluções que representem uma significativa contribuição para o bem estar da Humanidade.
O Brasil, talvez por Deus ser brasileiro, possui, após o encerramento da Conferência das Partes (COP 26), na Escócia, uma rara oportunidade para assumir a liderança na revisão das medidas anunciadas em Glasgow, o que se faz necessário, caso se queira efetivamente implantar um eficiente Mercado Global de Reduções de Emissões.
Estamos falando, especificamente, da Rio+30, que foi lançada oficialmente no último dia 24 de novembro e que deverá ocorrer ano que vem, no Rio de Janeiro..
De fato, as novas regras, anunciadas na última COP, nem sequer mencionam os ativos e tipos de projetos embutidos no conceito de REDD+, que havia sido instituído no Pacto de Varsóvia. Isso equivale a dizer que os ativos em que o Brasil apresenta a maior vantagem comparativa, e que poderiam ser obtidos com um baixo custo marginal de geração, como as reduções de desflorestamento e a preservação das florestas, não estão sequer previstos como passíveis de serem negociados no novo Mercado Global de Carbono que deverá vigorar sob o Acordo de Paris, ficando relegados a um ineficiente mecanismo de “Pagamentos por Resultados”.
Dentre os aspectos que merecem nossa atenção, na estruturação da Rio+30, podemos, assim, listar:
- O Pacto de Varsóvia que instituiu o conceito de REED+ precisa ser revisitado a fim de possibilitar a transformação de um mecanismo baseado em caridade, em eficientes mecanismos de mercado.
- O conceito de REDD+ precisa ser desagregado, em duas categorias de ativos: a primeira abrangeria as Reduções de Emissões oriundas de Projetos Jurisdicionais de Desflorestamento Evitado (RED), pois elas são idênticas às A6.4ER e poderiam, assim, ser perfeitamente aceitas para fins de compensação em um Mercado Global de Reduções de Emissões. De fato, não é admissível que metade das emissões brasileiras, caso sejam reduzidas, não possam ser comercializadas no Mercado Global. A segunda categoria de ativos de interesse para o Brasil, e que também é de extrema importância para o futuro do Planeta, seria composta pelos ativos que representam o estoque de carbono das florestas protegidas e preservadas (algo semelhante às Cotas de Reserva Ambiental, mas passíveis de captarem também recursos externos). Essa categoria de ativos precisa ser segregada em uma nova categoria de ativos porque não é possível misturar fluxos e estoques em um mesmo conceito. Os créditos oriundos da preservação das florestas precisam ainda de um novo conjunto de regras de mercado, pois se coadunam muito mais com as regras de um mercado de aluguel de Cotas de Reserva Ambiental, do que com as de um mercado de compra e venda de Reduções de Emissões. De fato, o aluguel é uma forma adequada para transformar estoques em fluxos, sem alienar a propriedade dos estoques de carbono.
- E, por fim, torna-se necessário propor uma profunda revisão dos procedimentos burocráticos, sobretudo aqueles que representam exigências baseadas em conceitos equivocados, como “adicionalidade econômica” e “permanência de fluxos”. Uma taxa de permanência, na verdade, faz todo sentido em ativos que representem estoques, como no caso de florestas protegidas. Mas jamais em Reduções de Emissões de Desflorestamento, que são fluxos anuais.
Estes três tópicos servem apenas para mostrar a importância da realização da Rio+30, ano que vem, no Rio de Janeiro. O detalhamento dessas propostas certamente terá que ser feito com todo esmero. Mas não há o que temer. Afinal, Deus é brasileiro.
Virgilio Gibbon* é Doutor em Economia pela Fundação Getulio Vargas e coordenou o Projeto de Implantação do Mercado Brasileiro de Reduções de Emissões, na BM&F, durante o Protocolo de Quioto.