Estrago causado pelas fortes chuvas em diferentes estados brasileiros nas últimas semanas evidenciam a necessidade de mudanças estruturais para atenuar os danos dos fenômenos climáticos extremos – Foto: Carol Custódio/SOS MG
Por – Rodrigo Santos de Jesus, da campanha de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil / Neo Mondo
Decretar Emergência Climática e implementar planos de adaptação nos estados é o caminho para que as consequências dos eventos extremos sejam minimizadas
Quais são as possíveis soluções para frear os impactos da crise climática? A resposta a esta pergunta já existe, o que falta é ela ser colocada em prática. Os Planos de Adaptação Climática estão entre os principais instrumentos para a prevenção dos impactos dessa crise nos territórios.
Um Plano de Adaptação Climática consiste em fornecer normativas e diretrizes para promover o ajustamento da sociedade e dos ecossistemas frente aos efeitos adversos da crise do clima.
As medidas de adaptação aos eventos extremos estão diretamente relacionadas com o quanto o poder público brasileiro está empenhado em destinar recursos para subsidiar boas condições de infraestrutura urbana, moradia, segurança alimentar, centros de saúde, entre outros direitos básicos, a fim de garantir capacidade de resiliência para a sociedade, em especial à população em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
Sabemos que as mudanças climáticas intensificam os eventos extremos, como alerta o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), o que torna ainda mais urgente que essas medidas sejam tomadas.
A emergência não deixa mais escolha para os governos que seguem adiando a adaptação às consequências das chuvas intensas, das secas prolongadas, das ondas de calor e outros eventos extremos.
As principais medidas de adaptação devem ser executadas em diferentes frentes, como por exemplo:
Combate à Desigualdade
• Garantir recursos destinados para perdas e danos causados pelos impactos da crise do clima, principalmente para populações em situação de vulnerabilidade.
• Assistência técnica para construção e reconstrução de casas.
• Estrutura de isolamento térmico nos domicílios com características insalubres (estudos científicos apontam que a temperatura dentro das casas acompanha as variações do clima, gerando desconforto térmico).
• Acesso a alimentação saudável para a população ameaçada pela insegurança alimentar e desnutrição.
Energia e Transporte
• Diversificação das fontes de energia, com foco em renováveis, com uma transição energética que respeite os direitos humanos, os limites da natureza, a biodiversidade e as populações em seus territórios.
• Mudanças nos projetos de infraestrutura da área de transporte, como substituição e adequação de pontes, estradas, postes, fiação, pavimentos, etc.
• Realocação e realinhamento de estradas, vias e linhas de distribuição.
Uso do Solo, Edificações e Assentamentos
• Criação de espaços verdes para melhorar a drenagem das chuvas e reduzir o efeito das ilhas de calor urbanas.
• Garantir a proteção e a conservação das chamadas barreiras naturais. Como, por exemplo, por meio da criação de diques, zonas pantanosas e úmidas que possam conter o aumento do nível do mar.
• Saneamento básico para as populações em situação de vulnerabilidade.
Recursos Hídricos
• Rever e modificar as fontes superficiais e subterrâneas de captação e transferências de água.
• Aumentar instalações/capacidade de armazenamento de água potável.
• Recuperar bacias hidrográficas.
Responsabilização do poder público
O papel do governo federal, dos estados e municípios na elaboração, execução e fiscalização dessas medidas é fundamental para relacionar e integrar as dinâmicas regionais e locais com as nacionais.
Entretanto, essas estratégias de planejamento precisam conter avaliação e monitoramento das áreas de vulnerabilidade a partir da percepção próxima e concreta da realidade. O que exige constante diálogo com as mulheres, negros, povos indígenas, comunidades tradicionais, camponeses, agricultores e agricultoras familiares e todo segmento da população que historicamente está nas principais estatísticas dos casos de perda material, mortes, desabrigados e desalojados por secas, enchentes, alagamentos e deslizamento de terra.
O processo de adaptação não é simplesmente um conjunto de normas fixas e rígidas, pois para cada realidade ou território é necessário considerar a variabilidade climática e seus respectivos impactos. A imprevisibilidade das condições atmosféricas não pode ser utilizada como justificativa para a inação do poder público.
É urgente se adaptar! Independentemente se existe um histórico de impacto na cidade ou estado, a crise climática já é realidade e nos atinge coletivamente. Desde as comunidades urbanas que sofrem com aumento de preço dos alimentos como consequência da seca na região sul do país, ao maior impacto direto na vida daqueles que já sofrem com a violação de direitos básicos, como inundações, deslizamentos, desmoronamentos, entre outros.
Essa mudança exige que o poder público coloque em prática um investimento direcionado a suprir as demandas sociais perante a emergência climática. Só que o Brasil está caminhando no sentido contrário.
O Fundo Nacional sobre as Mudanças do Clima (FNMC) é um instrumento da Política Nacional sobre Mudança do Clima e foi criado em 2009 para financiar projetos, estudos e empreendimentos que visem a redução de emissões de gases de efeito estufa e a adaptação aos efeitos da crise climática. Dos R$ 505 mil aprovados do FNMC pela Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2021 para o cumprimento desse objetivo, foram destinados apenas R$ 319 mil, segundo o Plano Anual de Aplicação de Recursos (PAAR). E, em 11 anos, foram contemplados somente 15 projetos.
De acordo com o levantamento realizado pelo CDP – Disclosure Insight Action, em um questionário aplicado em 2020, apenas sete estados brasileiros (PE, MG, SP, AC, TO, RS e GO) disseram possuir um plano de adaptação climática e, mesmo nesses casos, falta acesso didático aos documentos e indicações de ações efetivas, com orçamento assegurado às medidas de adaptação e perdas e danos às populações impactadas. Ainda que a responsabilização das três esferas públicas seja urgente e necessária, o Plano de Adaptação Climática precisa conversar com a realidade do território e pensar a solução de acordo com a dinâmica da realidade local.
É urgente que os governadores estaduais decretem emergência climática e implementem o quanto antes um Plano de Adaptação, além de outras medidas que atenuem as consequências da crise do clima.