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ARTIGO
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POR – MÁRCIO JAPPE*, PARA NEO MONDO
Há múltiplas maneiras de explicar o que é inovação. Dentre elas, a que eu mais gosto é: “solucionar problemas reais, com soluções de mercado, em contextos com altos níveis de incerteza”, por considerá-la ao mesmo tempo simples e abrangente.
Para gerar valor é preciso atender uma necessidade ou, em outras palavras, resolver um problema. Para que o produto não passe de uma invenção, é necessário que parte do valor gerado possa ser capturado por meio de um modelo de negócio viável, ou seja, só há inovação quando há inserção no mercado. Finalmente, inovação envolve incerteza, o que via de regra demanda práticas de gestão mais voltadas para a validação de hipóteses e gestão de riscos associados a se empreender algo em tal contexto.
Afirmar que inovar é desafiador é quase um pleonasmo, às vezes literário, noutras, vicioso. E o que dizer de negócios de impacto que almejam inovar para resolver questões sociais e ambientais relevantes? Muita inovação e muitos desafios, definitivamente.
Alguns dos erros mais comuns que vi acontecerem no atendimento de centenas pessoas empreendendo negócios de impacto estão relacionados à definição do problema a ser resolvido, um desafio central para o desenho e desenvolvimento de modelos de negócio viáveis. Como já demonstrado pela práxis do empreendedorismo inovador descrita em metodologias específicas tais como Startup Enxuta, Modelo de Desenvolvimento de Clientes e o Caminho Empreendedor, uma definição equivocada do problema a ser resolvido pode ser fatal até mesmo para negócios de muito potencial.
Há equipes tão comprometidas com a resolução dos problemas do mundo que confundem estes com os problemas a serem resolvidos pelo seu modelo de negócio. Sim, são coisas diferentes! Não há problema relevante no mundo que também não seja complexo e multifacetado. Considerando a limitação de recursos inerente a empreender, há poucas chances de se abordar toda a complexidade e faces do problema de forma efetiva. Focar em um (ou poucos) aspecto(s) do problema ajuda a focar em um modelo de negócio mais facilmente “testável” (lembra da redução de incertezas?).
Há também as equipes que não conseguem dar especificidade suficiente ao problema, não tornando possível “personificá-lo”. No fundo, no fundo, mesmo em problemas de uma organização (empresa, ONG ou governo) sempre há uma pessoa (“para todo problema de um CNPJ há um CPF interessado) para quem a dor dói mais. Entender quem é esta pessoa é essencial para a modelagem específica do produto e, não menos importante, do negócio como um todo.
Outras duas ramificações deste mesmo desafio na definição do problema são: 1) não diferenciar o usuário/beneficiário da solução do cliente pagante e 2) descrever o problema como a falta da solução. Enquanto aquela faz com que a viabilidade financeira do modelo acabe em segundo plano, a segunda é sintoma de uma paixão exagerada pela solução, quando na verdade as paixões da equipe empreendedora devem girar ao redor do problema a ser resolvido e das pessoas a serem atendidas. A diferença no uso mais racional dos recursos é enorme.
Obviamente que é muito mais fácil falar do que feito, mas rapidamente definir de forma clara o problema a ser resolvido e o público pagante a ser atendido pode fazer muita diferença na sobrevivência de muitos negócios de impacto inovadores. Para isto, vale lembrar que: o problema do mundo é uma coisa, o problema resolvido pelo seu produto é outra; que para todo CNPJ há sempre um CPF; que a falta do seu produto não é problema, mesmo quando ele é a solução; e que usuários são usuários, mas nem sempre são pagantes. Não são sugestões coletivamente exaustivas, mas já são um ótimo começo.
*Márcio Jappe é sócio-fundador da Semente Negócios, mestre em inovação, tecnologia e sustentabilidade pela UFRGS.