Rio Pixaxá, no município de Altamira, PA – Foto: Claudio Angelo/OC
POR – OBSERVATÓRIO DO CLIMA / NEO MONDO
Projeto de R$ 900 milhões quer criar polo de alta tecnologia na Amazônia para explorar potencial econômico da floresta em pé
Um grupo de cientistas brasileiros apresentou na última semana em São Paulo o projeto de criação de um instituto de tecnologia na Amazônia, para produzir conhecimento que viabilize a exploração econômica da floresta em pé.
Inicialmente orçado em R$ 891 milhões, o AmIT (Instituto de Tecnologia da Amazônia, na sigla em inglês) seria uma instituição público-privada, com cinco grandes laboratórios e unidades espalhadas pelos nove países da região amazônica. Ele é inspirado no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), universidade americana voltada para o desenvolvimento de tecnologias de ponta, que enviou representantes ao lançamento do pré-estudo de viabilidade e vem dando um discreto apoio à iniciativa.
Vertida para o português, porém, a sigla revela a origem da proposta: ITAm. Ela vem de um sonho antigo de alguns pesquisadores de criar na região amazônica um centro de ensino e investigação que realize na floresta o mesmo que o ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) realizou no interior de São Paulo: construir uma base industrial nova alicerçada em produtos de alto valor agregado.
O projeto foi concebido em 2008, por um grupo da Academia Brasileira de Ciências encabeçado por três gigantes da pesquisa amazônica: a geógrafa Bertha Becker (1930-2013), o climatologista Carlos Nobre, então no Inpe, e o zoólogo Adalberto do Val, ex-diretor do Inpa (Instituto de Pesquisas da Amazônia).
Na época, foi previsto o investimento de US$ 1 bilhão por ano para criar uma universidade e vários centros de pesquisa tecnológica na Amazônia, de forma a explorar a tal “economia do conhecimento” que zerasse o desmatamento. A proposta foi discretamente engavetada pelo então ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Roberto Mangabeira Unger.
De lá para cá, o cientista, hoje aposentado do Inpe e ligado ao Instituto de Estudos Avançados da USP, fez a fila andar. Nobre tem se dedicado a pensar estratégias de desenvolvimento da Amazônia com base na bioeconomia e em cadeias de produtos locais, como o açaí. Criou uma ONG, o Instituto Amazônia 4.0, dirigido por um de seus três irmãos cientistas, Ismael, e vem dando palestras mundo afora sobre o potencial do que ele chama de Terceira Via Amazônica.
Nesse embalo, e com a possibilidade de restabelecimento da normalidade democrática no Brasil a partir de 2023, o projeto do ITA amazônico foi tirado da prateleira e reformulado. “A ideia é atrair financiamento do setor privado e montar o instituto como parceria público-privada, liderado por cientistas amazônicos”, diz Nobre. Ainda com ele e Val à frente, a proposta ganhou outra adesão de peso: a antropóloga alemã Maritta Koch-Weser, que sabe como ninguém como não implementar modelos de desenvolvimento para a Amazônia.
No começo da década de 1980, Koch-Weser cuidava da área de meio ambiente do Banco Mundial quando o regime militar pediu um empréstimo de quase meio bilhão de dólares para pavimentar a rodovia BR-364, em Rondônia. A fim de não repetir o desastre que fora a construção da Transamazônica, na década anterior, o banco tentou formatar com o governo brasileiro uma proposta que incluísse proteção ambiental e de terras indígenas. Mas a área ambiental foi literalmente tratorada pela ala desenvolvimentista, interessada em fazer rodar o empréstimo e colher do Brasil um polpudo pagamento de juros.
O resultado foi que a BR-364 foi pavimentada sem o cumprimento da agenda socioambiental, resultando no quase extermínio do povo uru-eu-wau-wau e no maior desmatamento sofrido por um bioma natural em qualquer época do mundo – a chamada “Década da Destruição” de Rondônia. O desastre, denunciado por ambientalistas, fez o Banco Mundial criar uma série de salvaguardas e restringir empréstimos a obras de infraestrutura em países tropicais.
“A Nasa, a ESA e demais instituições espaciais apresentaram as fantásticas imagens do telescópio James Webb, resultado emocionante de um trabalho científico colaborativo global. Para a profunda descoberta da biodiversidade amazônica, da maior riqueza genética do planeta, precisamos do mesmo tipo de determinação e colaboração, científica e financeira”, disse Koch-Weser no lançamento do pré-estudo de viabilidade do AmIT. “Temos pressa: a natureza da Amazônia está sob ataque, como todos sabem.”