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POR – REDAÇÃO NEO MONDO
“As histórias indígenas — erroneamente chamadas de “mito” — nos revelam exatamente onde moram os milagres da vida: na comunhão, na partilha, na fartura, no pertencimento, na tolerância. Ler as histórias indígenas apenas com a cabeça não nos permite sentir a verdade que elas trazem dentro de si e que precisam ser ouvidas com o coração. Fica aqui, pois, meu convite: leiam essas histórias não com a cabeça, mas com o coração, que é o centro de todos os sentidos. É dentro dele que mora a magia, o sagrado, o mistério.”
Introdução por Daniel Munduruku
Professor, teólogo, filósofo, escritor e um dos principais defensores dos direitos humanos no Brasil, Leonardo Boff lança nova edição de O casamento entre o Céu e a Terra — Contos dos povos indígenas do Brasil, publicado pela Editora Planeta. No livro, o autor reúne relatos, mitos e histórias dos povos originários brasileiros, com o objetivo de ressaltar suas inestimáveis contribuições na constituição cultural do país. A publicação é dividida em duas partes: na primeira, diversas narrativas apresentam a epistemologia indígena, seus costumes, modos de pensar e compreender a natureza; na segunda, são apresentadas informações a respeito desses povos, como as etnias e línguas que se estendem pelo território brasileiro, bem como quais elementos contemporâneos fazem parte de nossa herança indígena.
Recolhidas ao longo dos anos e através de visitas a diversas etnias, as histórias dão explicações poéticas a fenômenos da natureza: “Como são grandes observadores, acumularam enorme sabedoria. Como nós, eles também perguntam: ‘Por que existem o dia e a noite? Por que as estrelas têm brilho diferente? De onde veio o guaraná, de que gostamos tanto?’. Para responder a essas indagações, contam estórias interessantíssimas. E elas nos enchem de encantamento”, afirma o autor no prefácio. Cada história é capaz de nos conectar à sabedoria ancestral das comunidades indígenas, reforçando sua importância na cultura brasileira.
Esta nova edição propõe uma abordagem literária, sem perder o contexto didático do livro quando foi originalmente lançado. Além de um viés inovador, a publicação da Editora Planeta conta com ilustrações da artista indígena Daniela Ramos (danirampe) e apresentação do escritor Daniel Munduruku. Em um momento de ameaças reais ao meio ambiente e ao futuro dos povos originários no Brasil, a nova edição de O casamento entre o Céu e a Terra torna-se essencial para colocarmos as culturas e as tradições indígenas no centro do debate.
TRECHOS DO LIVRO
Depois de ter vivido feliz com Denaquê por muitos e muitos anos, e ensinado aos Karajá a cultivar o milho, a mandioca e tantas coisas saborosas, Tainá-Can voltou ao céu para continuar a brilhar eternamente. E junto levou sua amada Denaquê. Por isso, como companheira inseparável, também brilha no céu, sempre junto da estrela-d’alva, também uma estrela singela e de brilho esmaecido.
Nunca mais deixaram de comer essas raízes. E foi assim que elas se tornaram o principal alimento dos Tupi-Guarani, das demais etnias e da maioria dos brasileiros, fazendo farinha, beijus e cauim. Chamaram então as raízes de Mandioca, que significa “casa de Mandi” ou também “corpo de Mandi”.
O Espírito das Águas teve pena imensa de Yara. Acolheu seu corpo machucado. Inspirou-lhe vida e devolveu-lhe todo o esplendor de sua beleza. Mas, para que não pudesse nunca mais ser violada, transformou-a em sereia.
O “índio” não existe. O que existe são centenas de nações indígenas, algumas tão diferentes das outras como é diferente o Brasil da Austrália.
Viemos de um projeto civilizacional que se estrutura ao redor do poder-dominação sobre os outros povos, as outras classes e a natureza. Esta sistemática agressão pode destruir a nós e à vida. Por isso, é urgente que aprendamos formas alternativas de relação para com a natureza. E os indígenas nos mostram o caminho.