Lula abraça Marina em entrevista coletiva em São Paulo (Foto: Ricardo Stuckert)
POR – OBSERVATÓRIO DO CLIMA / NEO MONDO
Candidato recebe de ex-ministra propostas para reconstrução da agenda ambiental no Brasil, começando com retomada de planos contra desmatamento
No primeiro encontro público após sete anos de ruptura, Luiz Inácio Lula da Silva recebeu de sua ex-ministra Marina Silva um conjunto de 26 compromissos de “resgate atualizado da agenda socioambiental brasileira”. O documento foi a condição da fundadora da Rede Sustentabilidade para declarar seu apoio à candidatura do petista à Presidência da República.
Entre as propostas estão a criação de uma autoridade nacional de segurança climática e a retomada e a ampliação dos planos de prevenção e controle do desmatamento na Amazônia e no Cerrado e sua expansão para os outros biomas do país. Conhecido como PPCDAm, o plano para a Amazônia foi a maior contribuição de Marina em sua passagem pelo Ministério do Meio Ambiente no governo Lula (2003-2008), e é considerado o principal fator por trás da queda de 83% na taxa de desmatamento verificada entre 2004 e 2012.
O PPCDAm, que vinha perdendo eficácia desde o governo Dilma, foi engavetado por Jair Bolsonaro e revogado. O desmatamento na Amazônia explodiu a partir de 2019 e iniciou a série de 2023 (medida de agosto deste ano a julho do ano que vem) com sinais preocupantes de alta.
A reaproximação foi iniciada no fim de semana, com um encontro de duas horas entre os dois, e selada com uma entrevista coletiva nesta segunda-feira em São Paulo, onde Marina disputa uma vaga de deputada federal.
O esperado pedido de desculpas do ex-presidente à ex-ministra pelos golpes abaixo da cintura dados nela pelo PT em 2014 não veio. Mas Lula, que chamou o reencontro de “um dia histórico para quem sonha em fortalecer a democracia em nosso país”, acenou com a incorporação das propostas levadas por Marina em seu programa, como uma linha de crédito para adaptação à mudança do clima e o avanço na implementação do Cadastro Ambiental Rural.
Lula também repetiu que acabará com o garimpo ilegal no país e apoiou a transversalidade da questão climática, que os sustentabilistas vêm insistindo há décadas que não pode estar confinada à área ambiental do governo.
“Quando a gente ganhar as eleições não haverá no nosso governo política de ministro. A política ambiental será tratada de forma transversal. Ou seja, todos os ministros terão obrigação com a questão climática. Não é o ministro do Meio Ambiente o único responsável, a política será responsabilidade de todos, do presidente ao ministério menor”, declarou o candidato.
A cúpula da Rede já havia liberado os integrantes do partido para apoiar Lula ou Ciro Gomes (PDT). Alguns, como o senador Randolfe Rodrigues (AP), já haviam entrado na campanha de Lula. Mas a própria Marina ainda não havia tomado uma decisão.
Uma das fundadoras do PT no Acre, a ex-senadora vinha se afastando de Lula desde 2008, quando o ex-presidente, pressionado por governadores da Amazônia, ameaçou revogar um decreto que cortava crédito de desmatadores – um dos instrumentos mais efetivos do PPCDAm. Isso causou sua saída do governo. Em 2010, Marina concorreu à Presidência da República contra a candidata de Lula, Dilma Rousseff, e teve 19 milhões de votos.
Em 2014, após a morte de Eduardo Campos, cabeça de sua chapa, Marina assumiu a corrida presidencial e estava à frente de Dilma. A petista, cujo marqueteiro era João Santana, fez uma série de ataques a Marina na televisão, usando alegações falsas, como a de que a independência do Banco Central, defendida pela acreana, iria deixar os pobres sem comida. A ofensiva surtiu efeito: Marina perdeu a vaga no segundo turno para Aécio Neves, a quem apoiou, rompendo definitivamente com Lula e o PT. Hoje João Santana, que chegou a ser preso na Lava Jato, cuida da campanha de Ciro Gomes.
Lula jamais pediu desculpas publicamente a Marina. O reatamento entre os dois leva o nome de Jair Messias Bolsonaro.
“Nosso reencontro político e programático se dá diante de um quadro grave da história política, econômica, social e ambiental do nosso país, em que nós temos o que eu considero a ameaça das ameaças, que é a ameaça à nossa democracia”, afirmou.
Questionada por jornalistas sobre críticas a Lula no passado, Marina disse: “A polarização aconteceu. Mas agora estamos diante de um quadro que é democracia ou barbárie, democracia ou aniquilação dos povos indígenas. Democracia ou aniquilação do povo preto, que está morrendo na periferia. Democracia ou destruição da Amazônia. Porque na base da democracia é que haveremos de reconstruir essas políticas.” E prosseguiu: “Ninguém precisa abrir mão do exercício da crítica, mas existe algo que é mais importante e que nos une”.