Mergulhador e raio-prego (Dasyatis hypostigma) no Parque Marinho da Laje de Santos (SP) – Foto: Nauther Andres
POR – REDAÇÃO NEO MONDO
Cerca de 70 espécies de raias podem ser encontradas em águas do litoral brasileiro. E 36 delas ocorrem no litoral do estado de São Paulo. Com o objetivo de conscientizar a população e estimular a conservação destas diferentes espécies de peixes cartilaginosos, pesquisadores do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (IMar/Unifesp) – Campus Baixada Santista estão desenvolvendo desde o último mês de janeiro no litoral paulista o projeto “Viu Raia?”, em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp), campi São Vicente e Registro, além da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
O projeto foi dividido em duas etapas. Na atual fase, chamada ciência cidadã, os trabalhos visam sensibilizar a população para ajudar nos esforços de preservação dos animais. “A partir dos registros feitos por mergulhadores recreativos, nós cientistas coletamos informações sobre quais são as espécies mais comuns de raias e em qual época do ano elas ocorrem no litoral de São Paulo e com que frequência são feitos os avistamentos”, explica Fábio Motta, professor do IMar/Unifesp e do Laboratório de Ecologia e Conservação Marinha (LabecMar) da Instituição.
O pesquisador revela também que estes registros fotográficos são divulgados pelos próprios mergulhadores, ajudando assim no monitoramento das raias, contribuindo ainda com dados sobre ocorrência de espécies e sazonalidade. “Nossa ideia é também ajudar com um guia para que os próprios mergulhadores possam identificar as espécies avistadas, com dicas e ensinamentos”, fala Luíza Chelotti, pesquisadora do IMar/Unifesp também ligada ao projeto e que é responsável por fazer as entrevistas com os mergulhadores.
Ela ressalta que, nessa primeira parte das atividades, acontecem a coleta das imagens e um trabalho de formação dos próprios mergulhadores. “Trata-se de um projeto de ciência cidadã, que ajuda a melhorar a capacidade deles próprios na identificação das raias”, completa Luíza.
SEGUNDA ETAPA — Num momento mais adiante, será aplicado no projeto um programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) para a preservação dos peixes. Segundo o professor Motta, a ideia é que mergulhadores recreativos — e, futuramente, outros agentes, como o próprio governo — passem a contribuir com um valor que seria revertido aos pescadores artesanais que capturem raias e devolvam o animal vivo ao mar. “Se os pescadores forem orientados a soltar estes espécimes capturados vivas, eles receberiam um pagamento por raia devolvida à natureza, evitando assim prejuízos na sua atividade econômica”, analisa o coordenador do LabecMar.
Ele revela que, no país, na maioria das vezes, os dados estatísticos sobre a pesca de tubarões e raias são reunidos em categorias multiespecíficas como cação e raia, respectivamente, sendo pouco úteis para as medidas de gestão pesqueira e conservação.
“Sabemos que as raias estão entre os animais mais ameaçados do planeta, com cerca de 36% das espécies com algum grau de extinção. No Brasil, essa taxa pode chegar a 30% quando incluímos os tubarões também, embora os dados sobre o tema sejam escassos”, aponta Luíza. Para a pesquisadora, a viabilidade do plano de pagamento depende, de um lado, dos mergulhadores estarem dispostos a contribuir e, do outro, dos próprios pescadores terem intenção de participar do processo da soltura.
Luíza reitera um ponto fundamental sobre o projeto: “É importante para nós usarmos novas ferramentas para falar de conservação. Atualmente, quando se fala em preservar espécies o foco é na biodiversidade, mas não podemos ignorar os desafios sociais daquelas pessoas que, muitas vezes, precisam da prática pesqueira para garantir a própria seguridade alimentar deles e da família”.
O retorno para a sociedade do projeto “Viu raia?” seria, na visão conjunta de Luíza e Motta, a longo prazo, aumentar as populações de raias e promover mais avistamentos pelos próprios mergulhadores. “E, quem sabe, tornar a região da Baixada Santista um polo de atração turística para mergulhadores recreativos interessados em ver estes espécimes de peixes”, desejam ambos.
O projeto tem ainda o apoio do Instituto Linha D’Água, uma ONG fundada em 2013 em São Paulo, atuando com iniciativas voltadas à conservação da biodiversidade social e marinha das regiões costeiras do norte do Paraná até o sul do Rio de Janeiro.