A jornalista Eleni Gritzapis (esq.) e a convidada especial Majory Imai gravando para o greenTalks – Imagem: Divulgação
POR – ELENI GRITZAPIS, ESPECIAL PARA NEO MONDO
Um bate-papo delicioso com uma mulher inspiradora que tem a inovação sustentável como marca da história de sua vida e de sua família, além de ser uma ótima contadora de histórias. O terceiro episódio da temporada 2024 do videocast greenTalks tem Majory Imai, a “Maju”, como entrevistada especial. Ela tem mais de 19 anos de experiência em trabalhos relacionadas à inovação e implementação de pesquisa climática e sustentabilidade. É CEO da Cyan Agroanalytics, plataforma de monitoramento climático totalmente integrada com sensoriamento remoto, diretora da Modclima, detentora da patente de uma tecnologia limpa de semear nuvens só com água potável, e foi também participante de uma série especial do TEDX cujo título é “Uma família que faz chover”.
Nesta conversa exclusiva, Maju homenageia o empreendedorismo do seu pai, o seu Takeshi, e conta a história de como sua família faz chover em regiões que sofrem com a seca e o impacto do risco climático, como o sertão nordestino. Ela fala também como a colaboração permeia muitos dos seus projetos e o quanto a tecnologia pode contribuir na busca de soluções limpas e sustentáveis para mitigar os efeitos das mudanças climáticas.
O greenTalks é uma iniciativa pioneira entre a green4T e NEO MONDO para discutir o papel fundamental da tecnologia na promoção de um futuro mais sustentável.
Confira os principais trechos da entrevista e assista a íntegra abaixo:
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(greenTalks) – Em seu TEDX. você conta a história do seu pai, o seu Takeshi, um homem que se reinventou diversas vezes, fazendo sua família ficar conhecida como a família que faz chover. Aliás, a admiração que você mostra por ele é contagiante. Conte-nos a história de como vocês começaram a fazer chover em regiões que sofrem com a seca e o impacto do risco climático.
O meu pai Takeshi Imai era inventor, engenheiro e tinha uma fábrica de maquinários agrícolas. Ele ficava à frente de construir os equipamentos, como bombas, motosserras e pulverizadores. Até que, um dia, ele produziu uma motosserra gigante, foi para Linhares (ES) testar esse equipamento e acabou cortando um jacarandá centenário em 25 minutos. A partir deste momento, ele ficou super mal, resolveu abortar esse projeto e decidiu não mais trabalhar com isso. Ele falava: “não quero mais jogar veneno, não quero mais cortar árvore”
Dali para frente, muita coisa mudou na vida dele. Ele sempre muito inventivo e decidiu focar em procurar solucionar problemas que tivessem a ver com a humanidade. Ele era um inventor meio porra louca e começou a desenvolver um processo de fazer chover usando só água potável. Daí nasceu a Modclima. Depositou uma patente e foi bater na porta da Sabesp. A empresa viu o projeto, se animou por não ser poluente e topou apostar nessa tecnologia. Aí eles começaram a tocar projetos experimentais no sistema Cantareira, que já chegou a abastecer 14 milhões de habitantes. A Modclima já teve mais de 10 contratos de indução de chuvas para o sistema Cantareira.
Em 2009, fomos chamados para ir para o sertão nordestino para fazer chuvas para uns produtores irrigantes perto da barragem Manuel Novaes, que estava em colapso hídrico. Conseguimos 17 chuvas em 25 voos, foi muito bacana. Em 2012, voltamos para o semiárido para fazer chover para produtores de abacaxi. E dali em diante já fomos para o Piauí, Maranhão, Bahia e até para a África.
A gente vê que essa tecnologia de indução de chuvas é uma ferramenta poderosa para momentos em que regiões sofrem com insegurança hídrica, como é hoje o caso do norte de Minas, que está perdendo a produção agrícola e está sem água também para o abastecimento das famílias.
(greenTalks) – Maju, li uma declaração sua numa entrevista em que você diz que “para trabalhar com a inovação, você tem que ter conhecimento, novas práticas tecnológicas, mas, principalmente, coragem”. Na sua visão, por que a coragem é importante para a inovação?
Todo mundo que trabalha com inovação sabe que a única certeza que temos é que não conhecemos tudo. Temos que lidar com o inesperado. Podemos definir um bom projeto, um bom caminho que acreditamos, mas quando vamos implantar sabemos que vamos ter que ajustar, que organizar. Tem horas que vai dar certo, mas tem horas que vai dar errado.
Quando iniciamos o projeto de induzir chuvas, tínhamos que lidar com aquela crença popular fortíssima que dizia: “aqui a gente faz de tudo, só não faz chover”. E nós mostramos que sim, nós fazemos chover…
A inovação opera na esfera da incerteza e precisamos ter persistência, ter coragem, ter resiliência e foco no nosso propósito. Sempre vão existir desafios para mudar um hábito, uma crença, uma estrutura, um fluxo.
Hoje, as empresas estão muito mais abertas para inovação. Quando começamos era na raça, tínhamos que acreditar e colocar recursos do nosso bolso. Ficamos endividados para poder fazer chover, era uma crença muito visceral. A estrutura atualmente é mais amigável, mesmo assim acho que as nossas instituições, os nossos dirigentes, as nossas empresas precisam ter mais coragem.
As questões ambientais e climáticas são muito complexas.
E. às vezes, fazemos chuva para aquele reservatório que já está meio secando, para aquele produtor que já está quase quebrando, para aquela floresta que já incendiou. Temos que ter coragem para mudar esse mindset, conseguir fazer chuvas para deixar aquela floresta verde sempre. Para que esperar? A floresta verde corre menos risco de incendiar. Temos que conseguir trabalhar projetos de médio prazo para os reservatórios poderem garantir segurança hídrica e não correr o risco de bater no volume morto…
Se conseguirmos ter o apoio de empresas que têm um alto consumo de água, como as de bebida, mineradoras, energia, alimento, conseguimos fazer um pool para adotar uma bacia hidrográfica e manter uma operação de chuva dedicada, para que ela tenha sempre água não só apoiar as operações industriais, mas também disponibilizar água para a população, para a fauna, para a flora. Precisamos sensibilizar as empresas para isso!
Ou companhias que são altamente emissoras de carbono para atmosfera, se elas se juntassem para adotar uma floresta e deixar uma operação dedicada para que essa floresta receba chuvas mais distribuídas, ela ficará mais umidificada, mais vigorosa para poder enfrentar o período de estiagem e incendiar menos. Isso são projetos de médio prazo e precisamos começar a despertar colaboração desses outros agentes para tocar projetos que façam frente a essas questões.
(greenTalks) – Na sua experiência de empreendedora nesta área, como a tecnologia pode contribuir ainda mais na busca de soluções limpas e sustentáveis para mitigar os efeitos das mudanças climáticas, aquecimento global, promover a recuperação do clima e do meio ambiente?
O nosso modelo de desenvolvimento econômico acelerado foi muito predatório, exauriu os nossos recursos naturais. Fomos crescendo sem limites e, com isso, detonamos as nossas florestas, acabamos com a diversidade, poluímos, emitimos carbono num volume que a Terra não é mais capaz de suportar. Então, a nossa temperatura já está aumentando, os eventos extremos estão ficando cada vez maiores. E tudo isso foi feito pela nossa forma de conduzir as coisas…
Acredito que esse mesmo talento que temos para desenvolver modelos de crescimento devem ser utilizados para fazermos o contrário. Temos que desenvolver tecnologia também escalonada, porque, se desmatamos escalonadamente, não adianta plantar de um por um, temos que fazer uma contrapartida escalonável. Se esgotamos recursos hídricos, por exemplo, não adianta só economizar água, temos que pensar em coisas que vão botar mais água para o sistema. E não é só isso, existem muitas outras tecnologias que precisamos juntar para fazer frente a essa situação que estamos vivendo hoje. Temos que estar abertos para continuar apostando em inovação, continuar tendo coragem de ousar, de apostar, de apoiar projetos, buscar soluções maiores para poder continuar morando bem nessa nossa casa que a gente chama de Terra.
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