Recuperação de pastagem degradada em MT – Fot -o Gabriel Faria
Por – Pedro Abel Vieira*, Antônio Marcio Buainain* e Roberta Grundling*, para Neo Mondo
O futuro da economia, que já vinha sendo redefinido de outras maneiras, foi acelerado pela pandemia e o verde será o mote principal conforme indica uma pesquisa realizada em 2021 pelo banco americano J.P. Morgan, com investidores de 50 instituições controladoras de US$ 13 trilhões em ativos. A pesquisa revelou que 71% dos entrevistados acham provável ou muito provável que governos e empresas aumentem as ações de mitigação das mudanças climáticas e perda de biodiversidade. Além disso, segundo a Confederação Sindical Internacional e New Climate Economy, para cada dólar investido, a energia limpa e outros investimentos verdes normalmente geram mais empregos do que investimentos não sustentáveis. Ou seja, não é por acaso que o ‘verde’ predominou na agenda do Fórum de Davos 2023, em linha com o indicado no livro “Brasil, Paraíso Restaurável”. Nesse livro, os autores alertam para o fato de que ninguém mais quer investir em energias sujas, sobrando recursos para estimular um futuro mais ecológico calcado nas energias limpas e renováveis. Ou seja, é uma verdadeira revolução nos fundamentos do investimento.
Produzir alimentos e energia que retiram carbono do ar constitui importante meio para controlar os problemas climáticos, além de criar empregos e renda. É verdade que na substituição da energia suja pela limpa, em um primeiro momento, há destruição de empregos, mas, no final, o balanço é positivo. Estudo recente mostra que o Brasil já possui cerca de 1,2 milhão de empregos gerados por energias renováveis e que esse montante aumentará de modo exponencial com novos investimentos numa agricultura cada vez mais sustentável, a exemplo da conjugação de lavoura, pasto e floresta em uma mesma área. Adicionalmente, essas atividades estimulam a indústria, o comercio e os serviços, permitindo, a um só tempo, limpar a atmosfera, alimentar o mundo, criar empregos e gerar renda de forma sustentável.
Não é por acaso que, durante recente visita ao Brasil, a ministra da Federal da Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha, Svenja Schulze, afirmou que o Brasil poderá ser líder global na geração de energia com hidrogênio verde. A transformação do gás hidrogênio em combustível demanda uma grande quantidade de energia que pode ser de diferentes ‘cores’, conforme a fonte de energia usada para produzi-lo. Há o hidrogênio cinza, produzido a partir de combustíveis fósseis. Quando essa produção vem de gás natural e há captura e armazenamento de carbono, temos o hidrogênio azul. Já o hidrogênio verde é aquele feito a partir fontes renováveis de energia sem a emissão de carbono.
Ainda não é possível estimar o quanto esta commoditie poderá agregar à economia do país, contudo, é certo que o Brasil tem boas condições para a produção dessa fonte energética que, cada vez mais, atrai a atenção de outros países. O interesse por este combustível, que tem como principal característica um processo produtivo não danoso ao meio ambiente, aumentou ainda mais por causa do risco de segurança energética pelo qual passa o continente europeu no atual cenário de guerra, uma vez que boa parte de seus países depende do gás exportado pela Rússia.
Em países de alta renda, empregos verdes são alternativas para a classe média, porém, em países de renda baixa e média, esses empregos fazem parte da economia informal e, portanto, têm baixos salários, acesso limitado à segurança no emprego e pouca proteção social. No Brasil, um país considerado uma ‘potência ambiental’, as oportunidades de investimento verde e geração de emprego são muitas, mas, nada se compara ao setor agrícola e seus transbordamentos. Além de responder por mais de 20% do PIB e do emprego nacionais, o Agro brasileiro tem batido recordes de produtividade calcados na inovação e na sustentabilidade ambiental. É fato que o desmatamento aumentou, notadamente na Amazônia onde a área desmatada (18%) aproxima-se do limite legal de 20%. Também é fato que o Brasil dispõe de mais de 100 milhões de hectares antropizados de baixíssima produtividade agrícola, as chamadas pastagens degradadas, que contribuem sobremaneira para a emissão de carbono do setor.
A despeito do desmatamento, que é mais um ‘tropeço’ do que a realidade, a agricultura brasileira pode ser ambientalmente sustentável como demonstra a técnica da Integração Lavoura Pecuária e Florestas, que pode sequestrar até oito toneladas de carbono por ano. Já as pastagens degradadas, além do compromisso voluntários de recuperá-las assumidos pelo Brasil na COP-15, são uma oportunidade ímpar para o país expandir a sua produção agrícola mitigando seus impactos negativos para o meio ambiente.
A tecnologia para recuperação das pastagens degradadas está disponível, a questão é que se, por um lado, a recuperação dessas pastagens contribuirá para a sustentabilidade ambiental, por outro lado, ela poderá ser insustentável economicamente devido ao aumento extraordinário da produção, notadamente de grãos e carnes. Além disso é preciso atenção quanto a infraestrutura nas regiões em que estão localizadas as pastagens degradadas. Falar em ‘pastagens degradadas’ para ampliação da produção agrícola brasileira sem promover o desmatamento é uma panaceia se não for tomado em conta as suas localizações, suas aptidões agrícolas e a infraestrutura existente. A geolocalização dessas informações nas áreas com pastagem degradada é fundamental para o Brasil avançar no compromisso assumido durante a COP 15, mas, não haverá recuperação sem a sustentabilidade econômica do processo.
É preciso ter em conta que o aumento indisciplinado na produção de grãos, carnes e madeira, fundamentos das técnicas vigentes para a recuperação de pastagens, têm limites impostos pelo mercado. Assim, um ‘bom’ planejamento da produção agrícola é item fundamental para a recuperação das pastagens degradadas e a produção de biomassa para energia parece ter limites bastante largos com o rearranjo da geopolítica global. O Brasil é um exemplo desse potencial, mas, para chegar a um paraíso restaurado, são cruciais políticas adequadas. Também é preciso ter em conta que políticas adequadas requerem estudos e ciência embasando planejamentos sérios de forma a atrair os grandes investidores que já decidiram ficar de bem com a natureza.
*Pedro Abel Vieira – pesquisador na Embrapa
*Antônio Buainain – professor no Instituto de Economia da Unicamp
*Roberta Grundling – analista na Embrapa