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POR – OSCAR LOPES, PUBLISHER DE NEO MONDO
Setor marítimo impõe primeira taxa global de carbono e inaugura nova era na governança climática internacional
No horizonte da transição energética global, um novo farol se acende: o oceano. Pela primeira vez, o transporte marítimo — gigante invisível que movimenta 80% do comércio mundial e consome mais petróleo que qualquer país além dos EUA e da China — será submetido a regras globais obrigatórias de redução de emissões de carbono.
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O acordo aprovado em abril de 2025 pela Organização Marítima Internacional (IMO), agência da ONU, transforma o setor em pioneiro entre as indústrias globais: passa a ser o primeiro com metas juridicamente vinculantes de descarbonização, integrando sanções financeiras, incentivos verdes e um novo mercado global de carbono.
Um pacto climático em alto-mar
O novo IMO Net-Zero Framework, a ser implementado a partir de 2027, exige que navios oceânicos com mais de 5 mil toneladas reduzam progressivamente suas emissões. A partir de 2028, será obrigatória a adoção de combustíveis com menor pegada de carbono ou o pagamento de taxas de até US$ 380 por tonelada de CO₂ excedente.
Com isso, embarcações mais eficientes poderão comercializar seus créditos com aquelas que não atingirem os cortes exigidos, num sistema de “cap and trade” global — o primeiro do tipo fora da União Europeia. A arrecadação alimentará o Fundo Net-Zero, voltado ao desenvolvimento de tecnologias limpas no setor.
A geopolítica do carbono e o pulso do multilateralismo
A decisão foi aprovada por 63 países, incluindo Brasil, China, UE, Japão, Índia e África do Sul. Dezesseis nações, lideradas por petrostados como Arábia Saudita e Emirados Árabes, votaram contra. Outras 25 — incluindo diversos Estados Insulares do Pacífico — optaram pela abstenção, frustradas pela falta de garantias sobre financiamento climático e justiça energética.
Em meio às negociações, os Estados Unidos ameaçaram retaliações econômicas caso a taxação fosse aprovada. A reação global, no entanto, seguiu firme e coesa — um raro exemplo de liderança coletiva em tempos de fragmentação diplomática.
Ambição versus realidade: o desafio da justiça climática
Apesar dos avanços, países vulneráveis e organizações ambientais criticaram as metas como insuficientes. A Clean Shipping Coalition aponta que, na prática, as emissões do setor devem se manter quase inalteradas até 2028. Já líderes do Pacífico, como Vanuatu e Tuvalu, alertaram para a falta de mecanismos robustos de apoio à transição justa.
Emma Fenton, da Opportunity Green, afirma que “a IMO tomou uma decisão histórica, mas que ainda falha com os países mais vulneráveis”. Mark Lutes, do WWF, completa: “Agora é hora de transformar metas em ação, com financiamento real e inovação limpa em larga escala”.
Brasil entre os protagonistas
O voto favorável do Brasil marca uma mudança de postura e insere o país na vanguarda da governança climática oceânica. O movimento ocorre em um momento simbólico: o Brasil se prepara para sediar a COP30 em Belém, na Amazônia, assumindo novamente um papel de ponte entre o Norte e o Sul Global.
A regulação dos mares não é apenas técnica — é política, econômica e moral. É um chamado à responsabilidade coletiva e à inovação solidária diante da emergência climática. Com o oceano agora regulamentado, o futuro sustentável da humanidade navega em águas mais claras — e, finalmente, com bússola.