Foto – Josh More/]Flickr
Por – Agência Bori / Neo Mondo
Pesquisador encontrou onze patentes da espécie Phyllomedusa bicolor registradas, na sua maioria, em países do Norte global
Pesquisa publicada na revista “Direito GV” na quarta (6) revela que registros de patentes relacionados a espécie de rã nativa da Amazônia foram realizados, em sua maioria, em países como Estados Unidos, Canadá, Japão, França e Rússia. Descrito por pesquisador da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o caso de apropriação de recursos genéticos da Phyllomedusa bicolor é exemplo de como brechas na regulamentação internacional de sistemas de patentes e imprecisões de termos normativos podem contribuir para que países do Norte global explorem recursos e saberes tradicionais de povos indígenas sobre a flora e fauna brasileiras.
O pesquisador realizou levantamento dos registros de patentes sobre a espécie de rã em bases de dados internacionais. A partir destes documentos, ele observou que países desenvolvidos predominavam nestes registros – o que demonstra uma lógica de transferência de recursos genéticos naturais e outros conhecimentos de países em desenvolvimento como o Brasil para países do Norte Global.
A maior parte das onze patentes vinculadas à rã referenciam termos científicos de secreção da espécie da Phyllomedusa bicolor. Com propriedades analgésicas e antibióticas, a secreção é conhecida e utilizada por mais de quinze povos indígenas do sudoeste da Amazônia, como os Matsés, segundo aponta revisão de estudos etnográficos presente no artigo. Todas as patentes foram obtidas após a Convenção da Diversidade Biológica, tratado da Organização das Nações Unidas firmado em 1992. Cinco delas foram após Protocolo de Nagoya, estabelecido em 2010, como forma de regulamentar e garantir participação justa e equitativa dos benefícios derivados de recursos genéticos da fauna e flora mundiais. Isto pode sinalizar lacunas desses instrumentos de regulação na proteção dos recursos genéticos naturais.
Segundo aponta Marcos Vinício Feres, autor do estudo, esse é o primeiro artigo de um projeto em andamento que pretende examinar o sistema de direitos de propriedade intelectual e seu aparato burocrático em todo o mundo. “Queremos analisar a possível estrutura de apropriação do conhecimento tradicional por meio do sistema de patentes”, explica o pesquisador. Entender os meandros burocráticos de transferência de conhecimento do Sul para o Norte Global tem importância estratégica para o Brasil, que tem uma grande biodiversidade em fauna e flora. Ao trazer luz para esse tema, pesquisas podem ajudar a proteger bens e saberes do território brasileiro.
Os próximos passos do grupo de pesquisa de Feres envolvem entender, a partir da perspectiva do direito, como se configura o sistema de patente e de uso de recursos da biodiversidade brasileira em outras regiões do Brasil além da Amazônia. “Temos regiões de Mata Atlântica e de Cerrado que possuem grande conhecimento tradicional associado e podem gerar oportunidades de lucro para o Norte Global”, completa o pesquisador.