A emergência climática está presente no nosso dia a dia – Foto: Divulgação
POR – ALEXANDER TURRA
Será que há saída para a emergência climática? As mudanças climáticas vieram para ficar, e elas estão cada vez mais evidentes no nosso dia a dia. Um exemplo disso são os eventos extremos que temos registrado, com magnitudes e frequências cada vez maiores, causando prejuízos significativos.
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As mudanças climáticas são causadas pelo aumento das emissões de gases do efeito estufa, especialmente pela queima de combustíveis fósseis, mas também por outras atividades humanas, como o desmatamento, as queimadas e a pecuária. Isso tem intensificado o efeito estufa, um fenômeno natural gerado pelas características da atmosfera, que torna a Terra habitável e mantém um padrão de temperaturas compatível com os seres vivos que habitam o planeta.
A consequência disso é o aumento da temperatura da atmosfera e, consequentemente, da temperatura do oceano. Com o oceano mais quente, mais água evapora e mais energia se acumula na atmosfera, o que se traduz em mudanças nos padrões climáticos e em eventos cada vez mais extremos, com registros de chuvas torrenciais se tornando frequentes nos noticiários. Esse é o chamado novo normal, que se manifesta na emergência climática, trazendo consequências severas para a economia e a sociedade.
As consequências das mudanças climáticas são diversas e resultam dessas alterações no funcionamento da natureza. Com a modificação dos processos naturais, os ecossistemas são afetados, comprometendo os benefícios oferecidos pela natureza às pessoas. Entre esses benefícios, destacam-se a capacidade de sequestrar e estocar gás carbônico, regular o clima, produzir oxigênio e garantir segurança hídrica e alimentar.
Em outras palavras, diversos grupos sociais sentem os efeitos das mudanças climáticas, direta e indiretamente. Agricultores têm buscado reduzir a vulnerabilidade de sua atividade, mudando suas plantações para regiões menos afetadas pelas mudanças no clima. No entanto, nem todos podem fazer isso, e a grande maioria ficará refém desse novo normal. De forma semelhante, uma solução para lidar com as ondas de calor cada vez mais frequentes tem sido a instalação de aparelhos de ar-condicionado. Mas, assim como no caso anterior, essa é uma solução individual que exclui grandes contingentes de pessoas de menor poder aquisitivo, além de aumentar a demanda energética e, consequentemente, as emissões de gases do efeito estufa.
O novo normal representa essa nova realidade, na qual nossa capacidade de previsão do que vai acontecer também fica comprometida. Esse cenário já vinha sendo revelado pela ciência desde a Rio 92, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada no Rio de Janeiro em 1992. Nessa ocasião, foi criado o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), órgão que assessora a ONU com base no melhor conhecimento disponível. Apesar dos alertas, as medidas para combater essa que é uma das principais crises da atualidade não têm sido tomadas. A negação das evidências, a dependência de combustíveis fósseis em países sem alternativas existentes ou potenciais e os conflitos de interesse associados à indústria do petróleo nos levaram ao cenário atual, ultrapassando o limite de 1,5ºC acima do período pré-industrial no final do século XVIII.
O Acordo de Paris, assinado em 2015, tampouco foi implementado de forma eficaz, revelando que a mesma dinâmica que gerou o cenário atual também é responsável por mantê-lo. Ou seja, o mesmo anormal. O anormal está na forma como a ciência é desvalorizada e na maneira como os tomadores de decisão colocam em risco as camadas mais vulneráveis da sociedade, favorecendo pequenos grupos influentes motivados por interesses de curto prazo. Esse anormal se traduz no que chamamos atualmente de negacionismo climático, uma postura que não deixa de ser uma irresponsabilidade climática.
Precisamos enfrentar a emergência climática de forma aberta e direta. Para isso, devemos atuar em duas frentes: mitigação e adaptação. A mitigação busca reduzir as emissões de gases do efeito estufa e está diretamente relacionada à transição para uma matriz energética de baixo carbono, ou seja, que não dependa de fontes fósseis, como petróleo, carvão e gás natural. Já as ações de adaptação miram na capacidade da sociedade de reduzir sua vulnerabilidade e aumentar sua resiliência diante das mudanças previstas. Entre essas ações, podemos citar a remoção de pessoas de áreas de risco, a criação de áreas protegidas para que a biodiversidade possa se adaptar às mudanças e iniciativas voltadas para garantir a segurança hídrica e alimentar.
Em ambas as frentes, será necessário adotar medidas coerentes e estruturantes, com a antecedência necessária para salvar vidas e evitar maiores prejuízos financeiros, como os registrados no Rio Grande do Sul em 2024, quando chuvas e enchentes devastaram o estado. Para tanto, algumas ações-chave são fundamentais. A primeira é fomentar a ciência climática e sua capacidade de fornecer respostas aos desafios impostos. A segunda envolve subsidiar iniciativas de tecnologia, inovação e novos negócios para que possamos explorar as oportunidades de uma economia de baixo carbono, reduzindo nossa dependência da matriz fóssil. O terceiro ponto está relacionado à educação, promovendo uma sociedade bem-informada e crítica. O quarto remete à necessidade de identificar e afastar políticos negacionistas, que representam um atraso para o desenvolvimento sustentável. Por fim, nenhuma dessas medidas será efetiva sem investimentos relevantes por parte do Estado, especialmente no Brasil, o que demanda um repensar do sistema tributário e fiscal, incluindo a revisão da dívida pública e das altas taxas de juros praticadas no país.
O Brasil tem potencial para ser um exemplo global nessas estratégias de enfrentamento. Todos os ingredientes estão ao nosso alcance, e o palco já está montado: a COP30 em Belém. Basta enfrentarmos o novo normal combatendo o mesmo anormal. O cenário alternativo é uma tempestade perfeita, um furacão, e, no seu olho, podemos estar todos nós. Será que vale a pena apostar? Melhor agir, não?
Biólogo, educador, pesquisador e comunicador. Professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo e coordenador da Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano, dedica-se a promover a aproximação entre o oceano e a sociedade.