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POR – OSCAR LOPES, PUBLISHER DE NEO MONDO
No Dia Mundial das Abelhas, celebramos mais do que um inseto — homenageamos o elo delicado entre flores, alimento e existência. E denunciamos, com amargura e urgência, o colapso silencioso que se avizinha
Elas não fazem ruído no debate público. Não ocupam manchetes, não vociferam nas redes. Mas sem elas, o mundo que conhecemos não se sustenta.
As abelhas são engenheiras da fertilidade, sacerdotisas da polinização, coreógrafas invisíveis da biodiversidade. Seu voo modesto carrega, sem alarde, o futuro das florestas, das lavouras e da nossa própria mesa. Celebrar o Dia Mundial das Abelhas (20 de maio) é, portanto, um ato de reverência — mas também de resistência.
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Onde há abelhas, há amanhã
Estima-se que mais de 75% das culturas agrícolas dependam da polinização. Sem abelhas, desaparecem os tomates, as maçãs, os cafés, os morangos e as castanhas. Mas desaparece também algo mais profundo: o ritmo vital entre plantas, clima e ciclos alimentares. No Brasil, as abelhas nativas sem ferrão — como a jataí, a canudo e a mandaçaia — são guardiãs ancestrais dos ecossistemas tropicais, presentes em quintais, florestas e rituais. Onde elas vivem, há equilíbrio. Onde morrem, a vida empobrece.
O apocalipse se move em silêncio
Mas o zumbido que antes preenchia os campos de vida agora se esvai. A queda vertiginosa das populações de abelhas é mais do que um dado técnico: é um sinal civilizatório de que rompemos um pacto com a Terra.
Entre as principais ameaças, não há mistério — há responsabilidade:
Agrotóxicos neurotóxicos (como os neonicotinóides)
Desmatamento e fragmentação de habitats
Mudanças climáticas e eventos extremos
Doenças e espécies invasoras
Poluição generalizada do solo e do ar
No Brasil, são frequentes os relatos de mortandade súbita de milhões de abelhas em lavouras pulverizadas, sem qualquer controle rigoroso. A monocultura e o veneno seguem como pilares de um modelo agrícola que produz lucros, mas devasta a vida.
Sem abelhas, não há soberania
Não é exagero dizer que a segurança alimentar global depende dessas criaturas com menos de 2 gramas. Cada flor visitada, cada voo repetido, carrega uma força silenciosa que equilibra sistemas inteiros. E, no entanto, as políticas públicas seguem tímidas, o mercado segue explorador e a sociedade, muitas vezes, indiferente.
Celebrar o Dia Mundial das Abelhas não pode ser apenas um gesto simbólico. É preciso desnaturalizar o colapso, politizar a proteção, valorizar o conhecimento tradicional e romper com modelos que tratam a natureza como descartável.
Resistir com mel, flor e poesia
Felizmente, há caminhos possíveis. A meliponicultura de base agroecológica, o resgate de práticas indígenas, o apoio a apicultores familiares, o banimento de venenos já proibidos em outros países e a educação ambiental enraizada nas infâncias são sementes que precisam germinar.
Como disse Rumi: “As abelhas extraem o doce da flor, mas deixam a flor intacta.”
É essa ética do cuidado que precisamos recuperar. Uma ética que produz sem destruir, nutre sem violentar, colhe sem esgotar. A abelha não é só símbolo — é profecia e advertência.
Neste Dia Mundial das Abelhas, reflita:
Plante o que floresce e nutre
Rejeite o que contamina e mata
Apoie quem cultiva saberes e abelhas
Exija políticas públicas robustas
E sobretudo, escute o silêncio que cresce onde antes havia zumbido
Porque o dia em que as abelhas forem apenas memória…
…será também o dia em que nossa história começa a desaparecer.