A jornalista Eleni Gritzapis e o convidado Paulo Zanardi Jr. gravando para o greenTalks – Imagem: Divulgação
Por – Eleni Gritzapis, especial para Neo Mondo
No mais novo episódio do greenTalks, nosso convidado é Paulo Zanardi Jr., fundador e Chief Climate Officer na consultoria GSS Carbono e Bioinovação e da VBIO – Vitrine da Biodiversidade Brasileira, uma plataforma de bioeconomia que auxilia na captação e destinação de recursos para projetos da biodiversidade brasileira. Paulo nos conta sobre o seu compromisso pessoal de impulsionar impactos ambientais positivos, com foco especial nas Mudanças Climáticas e Biodiversidade Brasileira.
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O greenTalks é uma iniciativa pioneira entre a green4T e NEO MONDO para discutir o papel fundamental da tecnologia na promoção de um futuro mais sustentável.
Confira os principais trechos da entrevista e assista a íntegra abaixo:
(greenTalks) – Paulo, você é engenheiro civil de formação. Para começar, nos conte como foi a transição da Engenharia Civil para o campo das políticas de mudanças climáticas e inventários de emissões? Como isso virou compromisso pessoal?
Quando começamos a nossa carreira, temos que tomar as decisões muito novo, né? Numa conversa com meu pai, ele disse “faz engenharia que ela te abre a cabeça para diversos mercados, diversas formas de trabalhar diferente”. Segui o conselho e, no meio do curso, fui entendendo como é que funcionavam as coisas e surgiu a vontade de trabalhar com o meio ambiente. Na época, ainda não havia a graduação em engenharia ambiental, hoje tem cursos mais específicos dentro da própria engenharia, focados em meio ambiente, clima, biodiversidade.
Acabei entrando na área de saneamento ambiental, depois fui trabalhar com licenciamento ambiental e aí entrei no mercado do carbono. Na verdade, foi num dia que eu encontrei uma amiga minha desde os 12 anos de idade, e ela trabalhava com o mercado de carbono. E eu fiz a pergunta para ela, que é algo que hoje eu escuto quase que semanalmente dentro da GSS, que são pessoas me ligando e falando se sua área verde gera crédito de carbono. No meu caso, e ela tira a sarro de mim até hoje, disse que meu avô tinha um sítio pequeno no litoral do Paraná e indaguei se isso gerava crédito de carbono. E aí ela começou a me explicar o que que era.
Fui então fazer um mestrado em Engenharia Sanitária e Ambiental e depois fui para São Paulo para trabalhar com crédito de carbono. O meu primeiro projeto foi um projeto de geração de crédito de carbono em aterro sanitário. E, de lá pra cá, muita coisa foi acontecendo, a GSS já completou 15 anos e essa minha amiga virou minha sócia, trabalhamos juntos nas áreas de carbono, mudanças climáticas, gestão climática, mercado de carbono e biodiversidade, assessorando as empresas também nessa área de impacto, TNFD, acesso ao patrimônio genético brasileiro, entre outros temas.
(greenTalks) – Como está hoje o mercado de crédito de carbono regulado no Brasil?
O mercado regulado no Brasil ainda não existe, ele está num projeto de lei (PL) e esperamos que ele seja aprovado esse ano. Estamos, inclusive, assessorando a Confederação Nacional da Indústria e outras empresas em diversos pontos, entre eles entender a parte de offsets dentro do mercado de carbono. Imagino que, como está o PL hoje, assim que for aprovado, vamos ter mais uns 4 anos para iniciar realmente um mercado regulado.
Vale lembrar um pouquinho da história do mercado de carbono. Entrei nesse mercado em 2005, 2006, pré-protocolo de Kyoto, e a gente já estava gerando alguns créditos de carbono para serem comercializados nesse primeiro período, foi uma grande onda do crédito de carbono. O Brasil foi o terceiro maior gerador de crédito de carbono dentro de um mecanismo de flexibilização do protocolo, muitos projetos se tornaram viáveis por causa dos créditos de carbono.
Em 2008, tivemos a grande crise mundial e com isso, obviamente, uma grande recessão no mundo todo. Aí os créditos de carbono começaram a perder a valorização, foram diminuindo os preços e quando chegou no final do primeiro período do Protocolo de Kyoto, o preço chegou a 10 centavos de dólar por crédito de carbono – e ele era comercializado antes por 17 euros no Brasil. Desta forma, os projetos pararam, porque não tinha viabilidade financeira.
Nessa época, fechamos algumas parcerias estratégicas para manter o preço do crédito de carbono e começamos a atuar muito forte no mercado voluntário para gerar esse crédito para aquelas empresas que voluntariamente queriam compensar suas emissões. Fizemos diversos primeiros projetos de carbono neutro no Brasil.
E agora temos um novo boom gerado pelo mercado financeiro cobrando metas de descarbonização, a sociedade civil cobrando o mercado financeiro, mercado financeiro entendendo o que é o futuro e isso fez com que começasse a se falar do crédito de carbono novamente, os preços subiram e os projetos voltaram a acontecer.
(greenTalks) – Claramente, os dados e métricas são o grande diferencial do seu trabalho. Como a gestão climática e a descarbonização têm evoluído na indústria nos últimos anos? Qual o papel da tecnologia para a gestão climática efetiva?
Toda parte dos projetos envolvem tecnologia e dados, são extremamente importantes. O mercado de crédito de carbono é um mercado de balcão. O crédito de carbono, para ser gerado, passa por diversas etapas, leva-se, em média, dois anos para você gerá-lo. Mas a transação de venda é feita por balcão, então geralmente esses contratos acabam não aparecendo para o mercado e a falta de informações acaba gerando obviamente diversas confusões dentro do mercado – e distorções também.
Hoje vemos, por exemplo, diversas iniciativas, principalmente no agro, do pessoal oferecendo um projeto dizendo que é crédito de carbono e aquilo não é um crédito de carbono. Para que isso não aconteça, a tecnologia é fundamental para os sistemas de armazenamento e monitoramento de dados, inventários de emissões, identificar algum tipo de inconsistência e muitas outras etapas do processo.
(greenTalks) – Você defende a Democratização Climática e faz parte do movimento Repenso, que transforma empreendedores e suas micro e pequenas empresas em protagonistas da economia de baixo carbono. Conte-nos sobre esta iniciativa.
Fui community leader do GRI (Global Reporting Initiative), e na época uma colega passou o desafio de como fazer o reporte de sustentabilidade para pequenas empresas. Isso ficou na cabeça. Passado um tempo, conversando com um dos sócios, o tema surgiu novamente: como levamos a gestão climática para micro e pequena empresas?
Quem é micro e pequena empresa? No termo correto, é aquela que fatura até 4,8 milhões de reais por ano. E aí fomos conversar com elas para responder perguntas como: qual é a sua preocupação com o clima? Qual é a sua preocupação com o aquecimento global? E responderam que tinham uma preocupação real, mas não sabiam por onde começar.
Um padeiro, por exemplo, acorda às 5 horas da manhã para fazer o pão. Você acha que ele vai acordar às 4 horas da manhã para começar a estudar o que é aquecimento global e como vai impactar no negócio dele? Então, nós criamos a plataforma Repenso, em que oferecemos a capacitação, gestão e consultoria de uma maneira fácil e acessível. Por exemplo, para o dono de uma padaria, tenho que mostrar para ele que se faltar chuva, se não tiver precipitação, não vai ter água no reservatório, a conta de energia vai subir e o preço do pãozinho que vai chegar lá no consumidor final vai aumentar também. Se der algum problema no agro, por causa da mudança do clima, vai aumentar o preço da farinha.
Temos ainda na plataforma um módulo que automatiza o inventário de emissões, a gente faz todo um beabá para eles inserirem as informações e ele já sai com o relatório seguindo as regras do GHG protocol. Ele também tem acesso a um relatório de como pode compensar suas emissões, por meio de um banco de ações de mitigação, o que ele pode fazer no dia a dia, como, por exemplo, não deixar a geladeira do lado do fogão, porque vai consumir mais energia elétrica, e assim por diante. São práticas simples para que ele possa compensar as emissões.
Queremos dar a mesma visibilidade que as grandes empresas têm hoje para as micro e pequenas empresas. Por isso criamos uma vitrine onde ele pode externalizar para os seus stakeholders as ações que eles estão fazendo. Então esse é o nosso movimento de democratização climática, a plataforma Repenso. E é muito bacana porque tem muitas empresas, grandes empresas, que o estão utilizando hoje para fazer o inventário de emissões da sua cadeia de fornecimento, o seu escopo 3. Tem hoje bancos que já estão olhando a nossa plataforma para poder criar notas, por exemplo, para a rede de franquias. É uma maneira hoje de você selecionar aquelas empresas e mostrar que elas estão realmente seguindo em frente dentro de um processo de descarbonização.
Dentro da plataforma Repenso, temos padaria, estúdio de tatuagem, diversos tipos de micro e pequenas empresas que estão hoje fazendo a sua gestão climática.
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