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POR – ALEXANDER TURRA
Dia desses, dialogando com meu grande amigo Oscar Lopes, fundador e publisher do portal Neo Mondo, sobre um novo projeto dedicado ao oceano, tive um daqueles insights aleatórios. No momento pareceu apenas uma convergência cromática, mas depois o devaneio se mostrou profético. Estávamos dialogando sobre que abordagem poderíamos usar para tratar a temática oceânica dentro do portal. Sim, o Neo Mondo está lançando um HOTSITE dedicado ao Oceano. Isso é resultado de um esforço mundial que vem se avolumando, em função da Década das Nações Unidas da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, que está sendo construída e vivenciada de 2021 a 2030.
A Década do Oceano, como também é conhecida, tem um foco claro na ciência, no conhecimento. O conhecimento que precisa ser gerado a partir de novas pesquisas, mas também o conhecimento que precisa ser compartilhado com a sociedade. É aí que a Década se soma com a Cultura Oceânica, termo derivado da expressão em inglês Ocean Literacy, que visa ampliar a compreensão da sociedade sobre o ambiente marinho, sua importância e sobre como as atividades humanas têm afetado esse ambiente. Destaca-se o foco em canalizar essa compreensão para a estruturação de movimentos convergentes e sinérgicos que contribuam com a transformação da realidade desse ambiente e de tudo que depende dele. É por isso que a Década do Oceano enfatiza que temos que promover a “ciência que precisamos para o oceano que queremos” para podermos promover o “oceano que precisamos para o futuro que queremos”. De fato, esse movimento considera o oceano como um agente de transformação da sociedade.
Basicamente, esse processo foi internalizado em um dos dez desafios da Década do Oceano, que visa “restaurar a relação da sociedade com o oceano”. Em outras palavras, a UNESCO, que coordena a Década do Oceano, exemplifica esse desafio como os esforços para “garantir que os múltiplos valores e serviços do oceano para o bem-estar humano, a cultura e o desenvolvimento sustentável sejam amplamente compreendidos, que as ligações entre a sociedade e o oceano sejam reforçadas e que haja maior motivação, capacidade e oportunidades para as pessoas em todos os setores da sociedade tomarem decisões e comportarem-se de forma a garantir um oceano saudável.” Ou seja, precisamos conhecer mais sobre o oceano e ajudá-lo a funcionar adequadamente.
Isso leva em consideração a Convenção da Diversidade Biológica, resultado da Rio 92, que enfatiza que é fundamental que a humanidade aprenda a “viver em harmonia com a natureza” de forma que “até 2050, a biodiversidade será valorizada, conservada, restaurada e utilizada com sabedoria, mantendo os serviços ecossistêmicos, sustentando um planeta saudável e proporcionando benefícios essenciais para todas as pessoas”.
O Neo Mondo, como um portal que possui a sustentabilidade em seu cerne, não poderia deixar de dar destaque para esse tema, em especial por que o Brasil é um país líder na Década do Oceano e na promoção da Cultura Oceânica, cujas iniciativas precisam ser amplamente conhecidas. E aí retornamos ao início desse enredo e que vai permitir compreender o matiz que está para ser revelado. Mas qual foco dar a essa iniciativa voltada para o oceano no Neo Mondo? A resposta estava bem na nossa frente: Neo Ocean… Assim como a visão de um “novo” mundo, precisamos vislumbrar um “novo” oceano, o oceano do futuro. Mas, mais que isso, um oceano construído para as futuras gerações pelas novas gerações, pela juventude.
Assim, o HOTSITE Neo Ocean foi concebido pelo Neo Mondo (Oscar Lopes) e pela Cátedra UNESCO para a Sustentabilidade do Oceano da Universidade de São Paulo (Alexander Turra) como um canal dinâmico, diverso e inclusivo para propagar a voz, as aspirações e as ações da juventude pelo Oceano e seus futuros. Desse entendimento veio o insight acima referido… A juventude é azul, em uma referência ao filme “A liberdade é azul” do diretor Krzysztof Kieślowski. Esse filme, estrelado pela atriz francesa Juliette Binoche na década de 1990, trata do descomunal desafio de lidar com a perda. O azul remete à tristeza, à melancolia relacionada a algo que se perde e à angústia pelo que está por vir. No caso do filme era a morte do marido de Julie, personagem interpretada pela atriz, que a submerge em um universo de memórias e pensamentos. No nosso caso pode representar aquilo que temos registrado recorrentemente em relação ao oceano, como poluição, extinção de espécies e efeitos das mudanças climáticas, o qual temos a sensação de estarmos perdendo. Mas da mesma forma que no filme, no qual a personagem se liberta dessas amarras existenciais, o azul também representa o futuro, o reencontro, a alegria, a vida.
A juventude é azul e representa a inquietação, os conflitos internos e externos, o sonho, a superação. Aquilo que se assemelha com o percurso do oceano que, como no filme, deseja ser livre. A trilogia “A liberdade é azul” (1993), “A igualdade é branca” (1994) e “A fraternidade é vermelha” (1994) faz referência aos princípios da Revolução Francesa, liberdade, igualdade e fraternidade, que inspiraram a transição para a democracia no mundo. Embora ainda em busca da efetivação desses ideais, a humanidade, incluindo importantes esforços da Organização das Nações Unidas, tem criado movimentos que os fortalecem, como a Década do Oceano. Nela, eles estão representados pela tríade diversidade, equidade e inclusão, o que nos traz de volta à juventude. A juventude em todos os seus tons de azul que precisa ser ouvida.
Isso é o que o Neo Ocean pretende, dar cada vez mais espaço e valorizar cada vez mais o papel da juventude na discussão e promoção da sustentabilidade com foco no oceano, empoderando os jovens para os hercúleos desafios que se apresentam. E nesse ponto o azul transmite uma outra mensagem que nos permite exercitar uma conexão sistêmica entre nós e a natureza. Romain Rolland, escritor francês que promovia a luta contra o fascismo e a paz, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em 1915, definiu a sensação do eterno como algo “simplesmente sem limites perceptíveis, ou oceânico” ao comentar o livro “O futuro da ilusão”, publicado em 1927, junto ao seu autor, Sigmund Freud. Essa “sensação oceânica” remete a uma “sensação de eternidade”, a um “sentimento de um vínculo indissolúvel, de ser um com o mundo externo como um todo”. Mais do que uma visão espiritualizada de conexão do ser humano, considerando suas diferentes subjetividades individuais, com a natureza, representa um dos significados atribuídos para essa relação pela Plataforma Intergovernamental para a Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), valorizando seus valores intrínsecos e conservando a natureza pela natureza.
É nessa conjuntura de referenciais e princípios que o Neo Ocean pretende congregar jovens lideranças do Brasil e do mundo para explorar suas conexões com o oceano. O portal congregará ações, realizações, trajetórias, campanhas e mensagens de diferentes gerações em diferentes linguagens para a construção de um oceano sustentável e de uma cultura de paz amparada pela justiça azul.
Considerando o conceito de juventude da Organização das Nações Unidas (15 a 24 anos), dos Estatutos da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) e da Juventude (Lei 12.852/13) (15 a 29 anos) e de Profissionais do Oceano em Início de Carreira (do inglês Early Career Ocean Professional – ECOPs; até 35 anos), combinado com a flexibilização trazida pela UNESCO para o entendimento de ser jovem dadas as realidades de diferentes localidades, o HOTSITE Neo Ocean acolherá todos aqueles que se entenderem como jovens, independentemente de suas idades. O Neo Ocean considerará diferentes estratégias para possibilitar esses diálogos que certamente alimentarão nossas atitudes por um futuro mais azul.
Biólogo, educador, pesquisador e comunicador. Professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo e coordenador da Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano, dedica-se a promover a aproximação entre o oceano e a sociedade.