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Navegando até a serra do Pantanal

Escrito por Neo Mondo | 15 de janeiro de 2019

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Amolar - Pôr do sol visto do barco Lord do Pantanal - Foto: Cristina Rappa

POR – CRISTINA RAPPA, DE TOPETINHO MAGNÍFICO PARA COALIZÃO VERDE (1 PAPO RETO, CENÁRIO AGRO e NEO MONDO)

 

Em visita ao primeiro dia do congresso de aves de 2018 em São Paulo, o Avistar, onde eu faria uma apresentação sobre as minhas palestras em escolas sobre meio ambiente e pássaros, temáticas dos meus livros infantojuvenis, minha amiga Maria Luiza e eu somos cativadas por um irresistível convite: participar de uma viagem inaugural do barco Lord do Pantanal pelo rio Paraguai, na região da Serra do Amolar, no Mato Grosso do Sul.

A ideia dos donos do barco e da organização do Instituto Serra do Amolar, instituição que se dedica a pesquisas para a preservação da região, era aproveitar o recesso da pescaria na época do defeso, quando não se pode pescar. Otimizar o barco, prover renda à população local e ainda divulgar a região, incipiente em termos de turismo - com exceção dos aficcionados pela pesca esportiva - a amantes do ecoturismo, como os observadores de aves, os mergulhadores e os fotógrafos de natureza.

Eu, que já tinha ido ao Pantanal Sul duas vezes e uma, rapidamente, ao Norte, logo topei. Luiza, que nunca tinha estado no Mato Grosso do Sul, também se entusiasmou.

Amolar - Rio com serra ao fundo - Foto: Cristina Rappa

A Serra do Amolar, encravada entre o Mato Grosso do Sul, a Bolívia e o Mato Grosso, tendo o rio Paraguai como via de acesso, é uma região atípica do nosso pantanal, por ter montanhas no entorno e por permanecer alagada praticamente o tempo todo. Nessas condições, que favorecem o isolamento, a população, em sua maioria pertencente à etnia de índios Guapó, é de pouco mais de 300 pessoas, que sobrevivem da pesca e da criação de animais para sua subsistência. 

Outra característica que torna essa região muito peculiar é poder ali encontrar plantas de diversos biomas, como caatinga (sim, caatinga!), cerrado, amazônia e mata atlântica.

Jacarés e o espetáculo dos tuiuiús

Nas vésperas do feriado de 15 de novembro, que emendaria com o do dia 20, lá fomos nós a Campo Grande, onde nos reunimos com o grupo de cerca de 30 pessoas que viajaria conosco no Lord.

Amolar - Jacaré de papo amarelo - Foto: Cristina Rappa
Na primeira etapa da viagem, de ônibus até Corumbá, de onde sairia o barco, a aventura já tem início, com paradas para ver os jacarés adestrados pela Dona Maria, que assim tira seu sustento dos turistas, e um lindo balé entre pai e filho de tuiuiús, em que o último dá seus ensaios de voo, sob o olhar orgulhoso do progenitor. E para alegria e deleite nosso. Não me cansei de aplaudir e registrar esse espetáculo emocionante, que compensou o constrangimento pelos pobres jacarés gordos e manhosos. A rotina nos quatro dias no barco começava cedo - entre 4h30 e 5h30 - com um maravilhoso café-da-manhã preparado pela talentosa e incansável equipe do Lord do Pantanal (sinceramente, não sei como não engordei …) e a saída em duplas em lanchinhas, com um barqueiro dedicado a nos levar a explorar cada canto da Serra do Amolar. Conduzidas pelo experiente Naldo, Luiza e eu avistamos macacos, mamíferos aquáticos como ariranhas e capivaras, jacarés (inúmeros!), e lindas aves, como os gaivões belo, preto e carcará, tachãs, aracuãs, garças, biguás e biguatingas secando suas asas ao sol, martins pescadores, águias também pescadoras, socós, papagaios, maitacas verdes e tiribas-de-cara-suja, surucuás e inúmeras outras espécies não menos lindas.
Amolar - Gavião Belo - Foto: Cristina Rappa

Cadê a onça?

Só faltou a onça-pintada, com quem seis pessoas do grupo tiveram a felicidade de cruzar, e que Liz e Susana, excelentes fotógrafas, registraram em meio a muita emoção. Não é para menos! Nem sei como seria a minha reação ao ver uma onça livre de perto.

Fica para a próxima, não é, Luiza? E uma vez que ganhei nova viagem como prêmio no concurso de fotos promovido pela organização do passeio - com um registro (abaixo) do gado e de mercadorias sendo transportados de balsa pelo Paraguai, cena que presenciava diversas vezes ao dia, e com o contorno da linda serra ao fundo - o encontro com a onça pode não demorar a acontecer.

Amolar - Balsa com gado - Foto: Cristina Rappa

A bagagem da volta foi engordada pelas boas lembranças dos momentos passados com os novos amigos; as boas dicas e a emoção de avistar (apenas avistar no meu caso...) a choca-da-Bolívia com a experiente observadora de aves e fotógrafa Silvia Linhares; a simpatia e o profissionalismo dos biólogos Thomaz Lippareli e Marcelo Calazans; o carinho da tripulação do Lord; e as inesquecíveis e valiosas prosas com Seu Armando, o antigo dono das terras onde hoje funciona o Instituto Serra do Amolar.

Cuidar é preciso

Com algumas certezas voltei dessa expedição: que é preciso cuidar dessa região; educar para uma prática consciente de pescaria, especialmente porque o dourado (Salminus brasilienses), o cobiçado peixe do Pantanal, encontra-se ameaçado pela pesca predatória; e que a população local é a melhor defensora de sua terra. Mas, para retê-la no lugar, é preciso que tenha renda para viver dignamente e o turismo ecológico pode ser uma solução. Até para transformar caçadores em guias e guardiões da região.
Amolar - Foto: Cristina Rappa

E por falar no dourado, quando finalizo este texto leio que o governo do Mato Grosso do Sul suspendeu, por cinco anos, sua pesca - profissional, esportiva ou amadora - a fim de recompor os estoques pesqueiros. Que a medida seja de fato implementada e que o dourado volte a reinar nas águas limpas do Pantanal!

Não apenas a pesca do dourado precisa ser regulamentada e fiscalizada, como toda a pesca em si. Espantada com a quantidade de carcarás (Caracala plancus) em volta do barco sempre que aportávamos, aprendo com Seu Armando que a prática de "limpar" os peixes logo após sua pesca atrai essas aves de rapina. Toda vez que elas veem um barco o associam a comida fácil. O aumento nada natural de sua população afugenta diversas espécies de pássaros menores, normalmente predados pelo gavião.

Assim, faço meu trabalho de comunicação e torço para que a educação e a maior consciência das pessoas para as questões que ameaçam o nosso ambiente contribuam para a população de animais, como as onças-pintadas e os dourados, voltar a crescer.

Amolar - Tuiuiu pai e filho no ninho - Foto: Cristina Rappa

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