POR – REDAÇÃO NEO MONDO
Programa ensina empresários a aplicarem o turismo sustentável, junto com a comunidade, e os insere no mercado internacional.
Em uma simples caminhada por uma trilha no sul de Minas com um grupo de visitantes, pode-se notar que a relação dos profissionais do turismo com o meio ambiente está se estreitando. Indignado por que a sola da bota de borracha se descolou – e sem imaginar qual seria a reação daquilo que estava prestes a fazer – um dos turistas que seguia pela trilha, não teve dúvidas em arremessá-la à mata fechada. De repente a caminhada parou e o silêncio deu ênfase à voz do guia que dizia: – A borracha leva anos para se decompor na natureza, não podemos deixar esta sola lá. Fiquem aqui! Preciso pegá-la!
No paraíso ecológico do Pantanal Mato-grossense o guia se apressava a instruir os passageiros do bote a não descartarem nenhum objeto no rio, pois poderia ser ingerido pelos animais: jacarés, lontras e outros, podendo levá-los à morte. No litoral norte paulista, os mergulhos monitorados em águas cristalinas são um grande atrativo, com a condição de que tudo pode ser visto, mas nada pode ser levado como souvenir, nem uma simples estrela do mar.
Estas poderiam ser fábulas, caso não tivessem realmente acontecido. Hoje, não só a diversidade e a exuberância da beleza das terras tupiniquins atraem a migração turística. Mas também a forma com que a sociedade local convive com a natureza.
Percebendo este fenômeno, o país está adaptando a sustentabilidade ao ramo que acrescenta mais de 30 milhões na economia e empregou cerca de 2 mil pessoas em 2003 – segundo pesquisa realizada pelo IBGE, junto com o Ministério do Turismo e o Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR).
O Instituto Hospitalidade (IH), o Ministério do Turismo e o SEBRAE, com o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e da Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (APEX-Brasil), desenvolveram o programa Bem Receber que beneficia hotéis e pousadas com até 50 unidades habitacionais, visando a qualificação sustentável, e para tanto, a assistência técnica e a certificação profissional.
Como receber bem?
Com o intuito de gerar um círculo vicioso entre o homem e a natureza – o homem precisa da natureza para seduzir visitantes e a natureza precisa dos cuidados do homem para continuar existindo e oferecendo a ele subsídios para o desenvolvimento, o projeto Bem Receber desperta diferenciais competitivos que envolvem o turista ao clima sustentável que se cria no local onde é aplicado.
O trabalho de reeducação começa nos hotéis e pousadas, mas os empreendimentos e a população do entorno também são estimulados a se desenvolver de forma sustentável para que se crie um ambiente ecologicamente correto e lucrativo para todos.
Após uma palestra de sensibilização, aberta a toda a comunidade, e a definição do grupo de hotéis que serão beneficiados com o programa – cerca de 15 meios de hospedagem, para que haja uma maior mobilização, inicia-se a capacitação de multiplicadores e a avaliação dos empreendimentos. “Com o diagnóstico do local, inserimos um consultor capacitado para conduzir a implementação dos requisitos que garantem aos estabelecimentos a sustentabilidade, baseado a NBR 15.401” – explica o consultor do IH e coordenador do Bem Receber, André Sá.
Tendo a orientação de qual a melhor maneira de implantar programas que amenizem o seu impacto à natureza e que envolvem funcionários, hóspedes e todo o entorno, a visão comercial dos hoteleiros tem mudado. “Aprendemos a trabalhar em parceria com a comunidade, pois é ela quem gera atrativos para o turismo, cabe a nós somente oferecer hospedagem” – diz o proprietário da Pousada Solar Don Ramon em Canela (RS), Vicente Atz.
O empreendedor que investiu na instalação de um sistema de aproveitamento da água da chuva, em displays e manuais para informar e ensinar os procedimentos sustentáveis da região, intensificou a relação com a comunidade, entre outras medidas, e sente a diferença no comportamento dos hóspedes. “Percebemos que houve mais procura, frutos de indicações dos nossos clientes, que por sua vez, se tornaram mais fiéis ao Don Ramon” – destaca Atz.
Envolver o hóspede na consciência ambiental, na qual funcionários e sociedade local estão engajados, permite que o turista sinta-se colaborando com a preservação da natureza, medida que atrai o público europeu, que já tem esta consciência ecológica embutida nos vários níveis da sociedade.
Programa
O local onde o programa aplica-se é determinado pelo Comitê formado pelos parceiros, que avaliam número de empresas do setor, ocorrência de exploração sexual infantil, potencial de crescimento de várias regiões brasileiras. “Analisados estes critérios, definimos o local onde o programa irá atuar e, havendo interesse por parte dos empreendedores da região, iniciamos os trabalhos de implantação, que leva cerca de sete meses” – diz o consultor André Sá.
A atuação do Bem Receber está fundamentada na Norma Brasileira 15401:2006 que especifica os requisitos relativos à sustentabilidade de meios de hospedagem, especificando critérios mínimos de desempenho sustentável e certificando os empreendimentos.
Segundo Sá, embora o Bem Receber esteja em vigência há apenas um ano, já existe uma grande demanda ao órgão certificador do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (INME-TRO), e acredita-se que até outubro parte das empresas tenham recebido a certificação, propiciando melhores possibilidades de ampliação e visibilidade internacional.