POR – REDAÇÃO NEO MONDO
Processo complexo afastou de crianças e adolescentes a palavra Não.
Lousa e sites interativos, cursos à distância, portal do professor, escola online. Foram-se os quadros negros, chegaram os “quadros mágicos”. A parafernália tecnológica parece interminável e tudo o que há de mais avançado em ferramentas do ensino está disponível em colégios de centros mais avançados do País.
Na Baixada Santista do litoral paulista, em sala de aula do ensino médio do Liceu Santista, o smart board é exemplo de avanço tecnológico. Alunos dessa classe e de outras séries, ao simples toque de mãos, podem mover objetos e interagir com outros ambientes. “Além dessa superfície sensível, a lousa possui software que traz um banco de imagens e várias outras possibilidades para o professor”, afirma Alcielle dos Santos, coordenadora pedagógica do nono ano e do ensino médio.
Para a especialista, seria impossível enumerar as possibilidades que a tecnologia coloca à disposição do ensino, mas se arrisca a classificá-las: “há avanços eletrônicos, em telefonia, mídia, entre outros, com mudanças para o espaço educacional”. E cita a internet como a mais impactante no setor. A escola que não souber entender os novos tempos corre o risco de se tornar um espaço enfadonho, acredita.
Alcielle, técnica em informática e bacharel em administração de empresas, conclui Pedagogia e faz Pós-Graduação em aprendizagem cooperativa. É bom prestar atenção no que ela diz, sobretudo a atônitos pais, como os que a procuram em busca de ajuda para organizar a vida dos filhos. “A internet, por romper o paradigma do texto linear, enfeitiça todos nós”, constata, para alertar: “Por ausência de imposição de limites, que piorou com os avanços tecnológicos que inundam os quartos de meninos (e meninas), um processo bastante complexo afastou do mundo da criança e do adolescente a palavra não”.
O País precisa pensar – e muito – a melhor maneira de ver a educação em um mundo ao mesmo tempo rico de possibilidades, por isso mesmo complexo e desafiador. No que diz respeito a avanços tecnológicos, o momento que Alcielle enxerga é de muita oferta; à frente, a inclusão seria bem-vinda.
Vencendo o ceticismo
Em outra Baixada, a dos Campos e Lagos maranhenses, jovens moradores de municípios menos desenvolvidos desse estado só há bem pouco tempo passaram da situação de ceticismo e descrença sobre suas expectativas de cidadania plena para uma realidade mais de acordo com algum toque de modernidade.
Iniciativas educacionais com o apoio do UNICEF, UNESCO, Fundação Kellog em parceria com prefeituras e outras instituições são desenvolvidas com bons resultados. Uma delas, a ONG Formação – Centro de Apoio à Educação Básica, mediante o conjunto integrado de Projetos (CIP) Jovem cidadão. Fábio Alessandro Souza Cabral, coordenador de comunicação da ONG, explica que o que se pretende ali é “romper com o ciclo de pobreza existente”. Por isso, “nosso objetivo é melhorar a realidade de jovens que vivem nesses territórios com ações que visam promover o fortalecimento e a mobilização das organizações juvenis existentes em 10 municípios, até o fomento do debate entre a sociedade civil e o poder público, para a proposição de políticas públicas de educação, saúde, esporte e cultura que contribuam para o desenvolvimento sustentável”.
De 2003, quando tudo começou em apenas um município, até 2008, o Formação ganhou em consistência e parcerias com atividades de educação para crianças, adolescentes e jovens. Na caminhada, “mapeamos as necessidades educacionais do estado e concebemos os centros de ensino médio e educação Profissionalizante (CEMPs)”.
Fábio classifica de inovador o conjunto de ações, iniciadas no município de São Bento, que visam formar cidadãos conscientes mediante a assimilação de conceitos em áreas como educação, trabalho, arte, esporte, cultura, lazer, saúde, ecologia, políticas públicas. Estendido inicialmente o seu alcance para mais sete municípios, o CEMP chegou em 2007 à zona rural.
A região de presença da ONG tem, entre suas características, a predominância de municípios com grande extensão territorial, baixa densidade populacional com concentração no campo e baixo IDH, de acordo com o atlas de Desenvolvimento humano. Entre as práticas que contribuem para a elevação do nível de consciência das pessoas, o coordenador de comunicação ressalta atividades, dentro e fora das escolas. “Por meio de leitura, arte e esporte, envolvemos crianças, famílias e professores em situações de aprendizagem ampliada”, explica. “Hoje, podemos garantir que temos uma educação tridimensional: integral, integrada e contextualizada – com um diferencial revolucionário que articula ensino, pesquisa e extensão. Contamos para isso com bibliotecas e laboratórios específicos para cada curso: informática, enfermagem e físico-química. nossos alunos estão capacitados para desenvolver idéias e projetos.”
Ênfase na promoção humana
A tecnologia pela tecnologia não adianta, se não levar em conta o contexto social do País. Para não se correr o risco de acentuar a exclusão e aumentar ainda mais a desigualdade social brasileira. O alerta é do professor-doutor Walter Antonio Bazzo, da universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no Departamento de Engenharia Mecânica. Ele entende que muitas vezes falta estabelecer melhor a orientação e determinação de prioridades, em vez de apenas aceder ao argumento da inexorabilidade do progresso tecnológico. Não faz sentido, para o especialista, o avanço tecnológico se não se der “ênfase para convergir à promoção humana, expressa em qualidade de vida”.
Antes de mais nada, cabe aos governos definirem com mais reflexão os caminhos da modernização, defende Bazzo. Vivência não lhe falta porque trabalha no Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica (PPGECT) da própria UFSC, além de ser coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Tecnológica (NEPET) com atuação em educação tecnológica, relações entre ciência, tecnologia e sociedade (CTS). Se não bastasse, é orientador de Doutorado em educação pela mesma universidade, com atuação em ensino-aprendizagem, ênfase em métodos e técnicas de ensino no CNPq.
Valores éticos e objetivos sociais
O professor-doutor apresenta a proposta de trabalho educativo, que leva em conta “alternativas que socializem as tecnologias e amenizem os efeitos de possíveis malefícios na vida humana”. Bazzo alerta para uma distorção comum ao Brasil, que é: apresentar mudanças e não definir que rumo seguir.
A alternativa é avançar de uma modernidade técnica para a modernidade ética, alicerçada em valores éticos e objetivos sociais que levem em conta 10 prioridades, onde encabeça a lista cuidar da educação. Depois, vêm alimentação; saúde; cultura; tecnologia adaptada; meio ambiente; descentralização; eficiência; estado; soberania.
Bazzo tem certeza de uma coisa: a educação aí deve ser vista como “um caminho para a mobilização, para a formação de uma consciência crítica”, como algo que “extrapole os muros da escola em todos os níveis, alcançando a sociedade na sua plenitude, de modo a envolver tanto aqueles que têm acesso quanto aqueles que não têm acesso a bancos escolares”. Quem dirá a recursos tecnológicos de última geração!