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POR – REDAÇÃO NEO MONDO
Dados do relatório são um duro recado ao governo brasileiro e às petroleiras que pretendem aumentar a exploração de petróleo no Brasil
Após uma maratona nos dois últimos dias de negociações, os países aprovaram um novo relatório de ciência climática do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU. O relatório reúne pesquisas científicas atuais, com os principais cientistas e governos concordando com um sumário que expõe a realidade devastadora e os riscos representados pela crise climática e as maneiras pelas quais o mundo deve responder a ela.
O Relatório de Síntese da Sexta Avaliação do IPCC (AR6) destaca as rápidas reduções de emissões necessárias para atingir as metas climáticas intermediárias – reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 43% até 2030 e 60% até 2035, para zerar as emissões líquidas em meados do século e evitar que as temperaturas globais excedam o perigoso ponto de inflexão de 1,5°C. O documento reconhece, no entanto, que as políticas atuais estão fora do caminho para atingir essas metas, apesar da variedade de soluções econômicas disponíveis. Espera-se que os países avaliem seu progresso para atingir essas metas ainda este ano, no balanço global da cúpula do clima da ONU, a COP-28.
“Os impactos climáticos apontados hoje são piores do que os previstos no último relatório de síntese do IPCC de 2014. Os estudos mostram que os atuais 1,1°C de aquecimento do planeta já causaram mudanças perigosas na natureza e no bem-estar das pessoas em todo o mundo e, por isso, precisamos de medidas imediatas para barrar os impactos da crise climática. O IPCC dá, novamente, um recado contundente às lideranças de todo mundo: a natureza é inegociável e a mudança precisa ser feita agora”, diz Alexandre Prado, especialista de Conservação em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil.
O WWF pede aos governos que prestem atenção às advertências do relatório e ajam rapidamente a fim de implementar suas recomendações para limitar os impactos da crise climática. A organização pede aos líderes que reduzam rapidamente as emissões em todos os setores, aumentem os esforços para criar resiliência a eventos climáticos extremos e protejam e restaurem a natureza. Uma eliminação acelerada de combustíveis fósseis é a melhor maneira de evitar que o planeta ultrapasse 1,5°C e arrisque uma catástrofe climática total.
O texto também mostra que as soluções para diminuir os impactos da emergência climática já existem, mas que é preciso aumentar sua escala de impacto e popularizá-las. O IPCC mostra as opções de mitigação disponíveis em todos os setores que poderiam, em conjunto, fazer exatamente isso, desde restauração de ecossistemas a transição energética -neste ponto, as energias eólica e solar são, de longe, as opções de menor custo com maior potencial de reduzir as emissões até 2030.
“Infelizmente, no Brasil, ainda investimos e pressionamos os ecossistemas costeiros e marinhos nos debruçando sobre combustíveis fósseis, a exemplo da exploração que a Petrobras pretende fazer no chamado bloco FZA-M-59, a 159 quilômetros da costa do Amapá, na região da Foz do Amazonas, rica em biodiversidade e em manguezais, ainda pouco estudada pela ciência. Esse tipo de intenção não combina com as ações que precisam ser feitas para colocar em prática a transição energética necessária a nível global e sinaliza a necessidade do governo brasileiro se comprometer coerentemente com a agenda climática”, explica Flavia Martinelli, especialista de Conservação em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil
Os relatórios do IPCC são influentes, pois são usados por formuladores de políticas e governos para informar suas ações, moldar as negociações sobre mudanças climáticas da ONU e afetar a opinião pública. O Sumário para Formuladores de Políticas do Relatório de Síntese AR6 do IPCC foi discutido linha por linha pelos governos, ao longo de uma semana, na sessão de aprovação na Suíça, desde 13 de março até a aprovação em 19 de março.
O WWF dá as boas-vindas a este último relatório do IPCC e observa que ele destaca:
● que já existem muitas soluções de baixo custo para a necessária transformação de toda a economia [C.3]
● o custo de energias renováveis como eólica e solar caiu até 85% na última década [A.4.2]
● a importância da natureza e da conservação – incluindo a necessidade de conservar 30% a 50% da terra, água doce e oceano do planeta para manter a resiliência da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos em escala global [C.3.6]
● a urgência da ação nesta década, bem como até 2035 – a data vinculada à próxima rodada de contribuições nacionalmente determinadas sob o Acordo de Paris [B.6.1]
OUTROS ESPECIALISTAS DA REDE WWF:
Stephanie Roe, Cientista Líder Global de Clima e Energia do WWF e Autora Principal do relatório do Grupo de Trabalho III do IPCC, disse: “Este relatório representa a coleção mais abrangente de ciência do clima desde a última avaliação, realizada há quase uma década. Combinando as descobertas dos relatórios de milhares de páginas publicados nos últimos anos, o documento expõe com muita clareza os impactos devastadores que a mudança climática já está causando em nossas vidas e ecossistemas em todo o mundo, o futuro difícil que todos enfrentaremos se não agirmos juntos e as soluções que podemos implementar agora para reduzir as emissões e nos adaptar às mudanças climáticas.
“Alguns países já estão alcançando reduções sustentadas de emissões, mas a ação ainda não atingiu a escala ou a velocidade que precisamos. Com as emissões atuais ainda em seu nível mais alto na história da humanidade, estamos muito longe da rota, e a janela para limitar o aquecimento a 1,5ºC está se fechando rapidamente. Quanto mais cedo agirmos, e quanto mais essa ação for decisiva, mais cedo as pessoas e a natureza poderão colher os benefícios de um futuro mais limpo, seguro e estável. Temos todas as ferramentas de que precisamos, portanto está ao nosso alcance enfrentar esse desafio, se agirmos agora.”
Stephen Cornelius, Vice-Líder Global de Clima e Energia do WWF disse: “As evidências são claras, a ciência é inequívoca – é apenas a falta de vontade política que nos impede de tomar a ação ousada que é necessária para evitar uma catástrofe climática. Líderes que ignoram a ciência da mudança climática estão falhando com seus povos. Uma rápida eliminação dos combustíveis fósseis é essencial, assim como proteger e restaurar os ecossistemas naturais”.
“A natureza é nossa aliada secreta na luta contra as mudanças climáticas. Os sistemas naturais absorveram 54% das emissões de dióxido de carbono relacionadas ao homem na última década e desaceleraram o aquecimento global e ajudaram a proteger a humanidade de riscos muito mais graves das mudanças climáticas. Não podemos esperar limitar o aquecimento a 1,5°C, nos adaptar às mudanças climáticas e salvar vidas e meios de subsistência, a menos que também ajamos com urgência para proteger e restaurar a natureza. A natureza é uma parte inegociável da solução para a crise climática.”
MAIORES INFORMAÇÕES
● Os Relatórios de Avaliação do IPCC são avaliações periódicas sobre os conhecimentos mais recentes sobre as mudanças climáticas, suas causas, impactos potenciais e opções de resposta. O Sexto Relatório de Avaliação leva em consideração as conclusões dos últimos três relatórios de grupos de trabalho divulgados em 2021 e 2022, juntamente com três relatórios especiais anteriores. Mais informações sobre o IPCC estão disponíveis aqui: https://www.ipcc.ch/.
● A avaliação do IPCC sobre o que é necessário para proteger a natureza está bem alinhada com a recente formulação do Quadro Global de Biodiversidade acordado na Convenção sobre Diversidade Biológica em dezembro de 2022 – e apoia a meta de conservar 30% da terra e do oceano até 2030.
Principais conclusões dos relatórios do Grupo de Trabalho AR6 do IPCC:
● As emissões globais entre 2010 e 2019 foram maiores do que em qualquer década anterior na história da humanidade. Fonte: IPCC WG3
● A natureza absorveu 54% das emissões de dióxido de carbono relacionadas ao homem nos últimos 10 anos. 31% é removido por ecossistemas terrestres, incluindo plantas, animais e solos, e os outros 23% são absorvidos pelo oceano. Fonte: IPCC WG3
● Aproximadamente 3,3 a 3,6 bilhões de pessoas vivem em contextos altamente vulneráveis às mudanças climáticas. Fonte: IPCC WG2
● O sistema alimentar é responsável por cerca de um terço (23-42%) das emissões globais de gases de efeito estufa. Fonte: IPCC WG3
● Temos soluções em todos os setores para reduzir as emissões pela metade até 2030, em consonância com o caminho de 1,5°C. Fonte: IPCC WG3
● Entre 2010 e 2019, o custo da energia solar e das baterias de íon-lítio (usadas para armazenamento de energia) caiu 85%, enquanto os custos da energia eólica caíram 55%. Fonte: IPCC WG3
Relatórios do WWF com base na ciência do IPCC:
● O relatório do WWF “O Aliado Secreto do Nosso Clima: revelando a história da natureza no Sexto Relatório de Avaliação do IPCC” baseia-se no trabalho do IPCC para destacar as emergências interligadas das mudanças climáticas induzidas pelo homem e da perda de biodiversidade, e está disponível para download aqui. Infográficos disponíveis mediante solicitação.
● Outros relatórios do WWF relacionados ao ciclo de relatórios do IPCC AR6 incluem: “Clima, Natureza e nosso Futuro com 1.5°C” – faça o download aqui e “Sentindo o Calor: O destino da natureza além de 1,5°C de aquecimento global – faça o download aqui.