Ekôa Park, Aldeia Guarani – Imagem: Albori Ribeiro
POR – CLAUDIA GUADAGNIN*, ESPECIAL PARA NEO MONDO
“As raízes indígenas permanecem na sociedade brasileira na cultura, na gastronomia e nos nomes das cidades brasileiras. É preciso que todas as pessoas se reconheçam como parte dessa história”
No fim de semana dos dias 27 e 28 de julho (sábado e domingo), o Ekôa Park vai promover uma imersão no tema “Ancestralidade: Cultura Indígena no Ekôa com Ju Kerexu”, conduzida pela cacique da Aldeia Tekoa Takuaty na Terra indígena ilha da Cotinga, em Paranaguá, no litoral do Paraná. Ju Kerexu é nascida na terra indígena ilha da Cotinga, professora da língua Mbya-Guarani, poetisa e ativista indígena.
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A programação inclui vivências envolvendo a cultura Guarani, além de oficina de artesanato, ervas medicinais e apreciação de música e cultura gastronomia indígena. A quem interessar, uma atividade extra de “Leitura do Céu” a partir de conhecimentos originários e ancestrais também será oferecida.
Para participar, basta comprar o ingresso de acesso ao Ekôa: R$90,00 (inteira) ou R$45,00 (meia) para cada um dos dias de programação. O agendamento da participação e a compra do ingresso podem ser feitas aqui. As vagas são limitadas.
Para a atividade de “Leitura do Céu”, que ocorre no sábado, dia 27, das 19h às 22h, há um custo a parte: R$150,00 por pessoa. O valor inclui o ingresso para a participação na atividade, mas não o Day Use para acessar o Ekôa durante o dia. As inscrições para a atividade da Leitura do Céu podem ser feitas aqui.
Em entrevista ao portal Neo Mondo, Ju Kerexu falou um pouco sobre as expectativas que tem para o momento e sobre a condição dos povos indígenas no Brasil atualmente.
- Quais suas percepções em relação à atual condição dos povos indígenas no Brasil, especialmente, no que se refere à demarcação de territórios indígenas?
Ainda estamos muito distantes de viver uma situação adequada para os povos indígenas em relação a este assunto. São muitos os territórios ancestrais que ainda precisam ser demarcados. E nas regiões Sul e Sudeste, enfrentamos dificuldades ainda maiores em relação a isso. Por não termos esse reconhecimento Legal da existência e resiliência dos povos indígenas, muitas comunidades encontram dificuldades em construir escolas, postos de saúde e de ter acesso a outras garantias previstas na Constituição e que deveriam ser muito mais fornecidas às populações tradicionais. Como consequência, quando vão em busca desses serviços fora das comunidades, muitos indígenas passam por situações abusivas de racismo, preconceito, intolerância e são vítimas de muitas formas de exclusões. Muitos jovens indígenas, inclusive, desistem de estudar porque sofrem preconceito dentro das escolas ou universidades por conta de uma visão colonizadora que ainda existe. Precisamos, como sociedade, entender que, sem demarcação adequada de nossos territórios, não há garantia de direitos. Temos muitas lideranças indígenas que lutam com sangue e suor para garantir direitos básicos na constituição, mas, ainda, quem decide são pessoas que estão muito longe de conhecer e entender a nossa realidade.
- Qual sua expectativa para a COP de Belém, prevista para ocorrer em novembro de 2025?
Hoje, os povos indígenas representam mais de 300 povos de etnias diferentes, com línguas, culturas, tradições e saberes diferentes e riquíssimos. Éramos muito mais, mas os que estão aqui hoje, resistindo e lutando, precisam ser mais valorizados. A COP de Belém representa uma oportunidade muito necessária para trazer visibilidade para a nossa realidade como povos indígenas. Participei de uma no Egito e outra em Dubai. E a importância de falar hoje, mais do que nunca, sobre justiça e emergência climática é enorme. As mudanças precisam acontecer agora, com a máxima urgência, porque não há mais tempo. Nossa mãe terra precisa ser cuidada de feridas que estão sendo abertas há muito tempo pela humanidade. E, só haverá justiça climática, a partir da demarcação dos territórios e das áreas indígenas. Áreas naturais que já não estão mais suportando tanta degradação, agressão e supressão. Nosso papel como povos indígenas temos feito há muito tempo. Mas a população em geral também tem um papel essencial, que é o apoio a essa luta. É preciso fiscalizarmos as decisões de Brasília, cobrar por Leis que beneficiem a coletividade e o patrimônio natural e nos mostrarmos intolerantes com qualquer tipo de afrouxamento da Lei ou perda de direitos anteriormente adquiridos.
- Quais suas expectativas para a vivência indígena que vai conduzir no Ekôa Park, entre os dias 27 e 28 de julho?
As melhores possíveis. Vamos falar sobre ancestralidade, sobre a história na nossa visão de povo indígena, resgatar nossa memória ancestral e lembrarmos do quanto é importante entendermos que todos fazemos parte de um sistema natural, perfeito e interconectado. Nossa atividade de “Leitura do céu” vai falar sobre o caminho que nossos ancestrais faziam para acessar seus territórios por meio da análise do céu, recordar como eles faziam o Caminho do Peabiru para chegar até Morretes, e compartilhar a cosmovisão do povo Guarani. Com essa oportunidade, queremos promover o diálogo, conversar, nos conectar com um território que é sagrado, e mostrar para as pessoas o quanto se permanecem as raízes indígenas em nossa sociedade, seja na cultura, na gastronomia e até mesmo nos nomes das cidades brasileiras. Queremos que as pessoas, acima de tudo, se reconheçam como parte desse território e dessa história.
Programação
No sábado, dia 27 de julho, das 14h às 15h30, Ju Kerexu abordará, na oficina “Cultura Guarani e Artesanato Indígena”, a rica história e origem dos Guarani, explorando suas narrativas orais e seus mitos de criação. A estrutura social, incluindo o papel dos caciques e das lideranças espirituais, também será discutida. Além disso, Ju Kerexu tratará das crenças e das práticas religiosas, ressaltando a importância das rezas, dos rituais e das festividades na cosmologia Guarani. A preservação da língua Guarani, e suas iniciativas de revitalização linguística, serão destacadas na programação, assim como a arte e a cultura, incluindo o artesanato indígena. Uma das oficinas vai oferecer uma imersão nas técnicas e tradições do artesanato indígena. Os participantes aprenderão a criar cestos e fazer trabalho em madeira e adornos, utilizando materiais e métodos tradicionais. Ju Kerexu compartilhará conhecimentos sobre a importância cultural e espiritual do artesanato e da sustentabilidade no uso dos recursos naturais.
Das 16h às 16h45, no restaurante do Ekôa, o Oka Gastronomia, haverá uma programação do Coral Indígena, que fará uma celebração da rica herança cultural e musical dos povos indígenas. Eles compartilham suas tradições por meio do canto. O coral vai apresentar um repertório de músicas tradicionais cantadas em línguas nativas, que transmitem histórias, rituais e conhecimentos ancestrais.
No domingo, dia 28, das 10h30 às 12h, na Trilha do Peabiru, uma das trilhas do Ekôa, haverá uma oficina sobre ervas medicinais. A oficina “Ervas Medicinais Indígenas“, conduzida também por Ju Kerexu, oferece uma vivência imersiva na trilha. Durante a caminhada, os participantes aprenderão a identificar ervas medicinais nativas, suas propriedades curativas e métodos de preparo sustentável. A líder indígena compartilhará conhecimentos sobre a importância das ervas medicinais na cultura indígena, além de suas funções terapêuticas e espirituais. A oficina destacará a preservação da biodiversidade, o melhor uso das ervas medicinais e a sabedoria ancestral indígena, aplicando esses conhecimentos no cuidado com a saúde e no equilíbrio com a natureza.
No mesmo dia, das 14h às 15h30, no restaurante Oka Gastronomia, haverá uma Oficina de Culinária Indígena. Ela terá o foco no Xipa (um pão frito não fermentado, de origem Guarani) e promete oferecer uma imersão nas tradições culinárias dos Guarani.
Os participantes aprenderão a preparar duas versões da especialidade: uma com farinha de milho e outra com farinha de trigo. A oficina também vai ser conduzida por Ju Kerexu e a filha, que compartilharão histórias sobre a importância desse alimento, especialmente, durante a Guerra do Paraguai, quando muitos Guarani se alimentavam da preparação. Também será abordada a relação dos Guarani com a natureza e o uso sustentável dos recursos. Ao final, os participantes poderão degustar o Xipa e levar para casa o conhecimento para reproduzir a iguaria autêntica em suas casas.
Das 16h às 16h45, também no domingo, no Oka Gastronomia haverá mais uma apresentação do coral indígena.
O Ekôa Park, vale lembrar, fica localizado em Morretes, no litoral do Paraná, no território da Grande Reserva Mata Atlântica, uma área que reúne três milhões de hectares de floresta nativa, localizada entre os Estados do Paraná, São Paulo e Santa Catarina. O território é um importante patrimônio natural, cultural e histórico e um valioso e singular destino de turismo de natureza, nacional e internacional. O Ekôa foi membro fundador da Rede de Portais da Grande Reserva, um grupo composto atualmente por mais de 700 pessoas que apoiam a iniciativa.