Parque Estadual Encontro das Águas criado em 2004 com o objetivo de garantir a proteção dos recursos naturais e a movimentação das espécies da fauna nativa, preservando amostras significativas dos ecossistemas naturais existentes – Foto: Gustavo Figueroa
POR – OSCAR LOPES*, PUBLISHER DE NEO MONDO
Superfície de água encolhe ano após ano, com seca extrema na Amazônia e no Pantanal. O avanço do desmatamento e da exploração descontrolada acelera o colapso dos recursos hídricos do país
O Brasil está secando diante dos nossos olhos. A cada ano, rios desaparecem, reservatórios encolhem e biomas inteiros entram em colapso. Em 2024, a perda de superfície hídrica continuou em trajetória alarmante: 17,9 milhões de hectares de água, uma queda de 4% abaixo da média histórica.
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O que antes era um cenário preocupante, agora se tornou uma emergência nacional, ameaçando o meio ambiente, a segurança alimentar e milhões de brasileiros que dependem desses recursos. Quanto tempo mais vamos ignorar esse desastre iminente?
O colapso hídrico em números: Brasil nunca esteve tão seco
Os dados do MapBiomas mostram uma tendência assustadora de redução hídrica:
🔥 Pantanal: 61% da superfície de água perdida – um bioma inteiro está desaparecendo.
🌊 Amazônia: 4,5 milhões de hectares de água evaporaram desde 2022.
⚠️ O Brasil já perdeu 2,4 milhões de hectares de corpos d’água naturais desde 1985.
💧 8 dos 10 anos mais secos da história ocorreram na última década.
A cada ano, a crise se intensifica. O Pantanal, que já foi um dos biomas mais ricos em biodiversidade do planeta, hoje luta para sobreviver. Desde 2018, a região enfrenta ciclos contínuos de secas severas, e em 2024 a situação chegou a níveis críticos: incêndios descontrolados consumiram extensas áreas, enquanto a superfície de água encolheu para apenas 366 mil hectares.
A Amazônia, por sua vez, enfrenta dois anos consecutivos de seca extrema. 63% das bacias hidrográficas da região apresentaram perda de água em 2024, incluindo áreas que até então eram consideradas resistentes à estiagem, como a bacia do Rio Tapajós.
E o pior ainda pode estar por vir.
O paradoxo da água: um país rico em recursos, mas secando
O Brasil detém 12% da água doce do planeta, mas essa riqueza não está uniformemente distribuída.
🔹 Amazônia – Detém 61% da superfície de água do Brasil, mas sofre com secas extremas e desmatamento desenfreado.
🔹 Caatinga – Onde vivem 32 milhões de pessoas, tem apenas 5% da água disponível no país.
🔹 Cerrado – Apesar de um leve aumento na superfície hídrica em 2024, 60% da sua água agora vem de reservatórios artificiais, e não de rios e lagos naturais.
Essa desigualdade na distribuição da água se reflete no impacto social e econômico. Enquanto a Amazônia perde milhões de hectares de superfície hídrica, regiões como a Caatinga e o Cerrado se tornam cada vez mais vulneráveis à desertificação.
O crescimento da superfície de água em alguns biomas em 2024 não foi um sinal de recuperação, mas sim da dependência crescente da água artificialmente armazenada. A construção de hidrelétricas e reservatórios tem mascarado a real crise hídrica do país, enquanto os rios naturais secam e as nascentes desaparecem.
Seca, exploração e negligência: as causas da crise hídrica
Os números não deixam dúvidas: o Brasil está perdendo seus recursos hídricos, mas essa crise não é apenas climática. A degradação das águas brasileiras é resultado de um conjunto de fatores destrutivos, que incluem:
❌ Desmatamento desenfreado, reduzindo a capacidade de retenção de água dos solos.
❌ Expansão da agropecuária e da mineração, que consomem grandes volumes de água e secam nascentes.
❌ Urbanização desordenada, com assoreamento e poluição de rios.
❌ Construção de barragens e reservatórios, alterando drasticamente o fluxo natural das águas.
Regiões como o Oeste da Bahia e a Bacia do Alto Paraguai têm sido criticamente afetadas por essas práticas. No Cerrado, apenas 40% da água ainda vem de fontes naturais, uma queda drástica em relação aos 63% registrados em 1985.
No Pantanal, a construção de hidrelétricas e o avanço da agricultura irrigada estão alterando a dinâmica da água, tornando o bioma ainda mais vulnerável à seca.
Se nada for feito, o que restará do Brasil daqui a 20 anos?
A inércia do poder público e o risco de colapso
Mesmo diante de um cenário tão grave, as ações governamentais seguem lentas e insuficientes.
🔸 No Pantanal, o governo não apresenta um plano efetivo para conter as queimadas e recuperar as áreas afetadas.
🔸 Na Amazônia, a fiscalização contra desmatamento segue fraca, permitindo que rios sejam contaminados por resíduos de mineração e queimadas.
🔸 No Cerrado, as políticas públicas favorecem o agronegócio em detrimento da preservação das nascentes.
Enquanto isso, milhões de brasileiros já sentem os efeitos diretos dessa crise. No semiárido nordestino, cidades inteiras vivem sob racionamento, enquanto grandes empresas exploram indiscriminadamente os aquíferos. No Sul, as secas e enchentes extremas se alternam, deixando um rastro de destruição.
Até quando vamos normalizar essa destruição?
O futuro da água no Brasil: vamos esperar pelo colapso total?
O Brasil está testemunhando a maior perda de recursos hídricos da sua história, e ainda assim, seguimos sem um plano real de contenção. A cada ano, perdemos mais água, mais biodiversidade e mais qualidade de vida.
A seca avança, mas as políticas públicas seguem estagnadas, enquanto o desmatamento e a exploração predatória continuam.
Para reverter essa trajetória, é necessário um conjunto de ações urgentes e estruturantes, que envolvem:
✅ Gestão inteligente dos recursos hídricos, com fiscalização rigorosa contra desperdícios e exploração predatória.
✅ Ampliação do acesso ao saneamento básico, reduzindo a contaminação dos rios por esgoto e resíduos urbanos.
✅ Recuperação de nascentes e áreas degradadas, especialmente em biomas como o Cerrado e o Pantanal.
✅ Desenvolvimento de políticas públicas adaptativas, que considerem os impactos das mudanças climáticas na oferta de água.
Sem essas medidas, o Brasil pode enfrentar, nos próximos anos, uma crise hídrica sem precedentes, afetando não apenas o meio ambiente, mas também a segurança alimentar e a qualidade de vida de milhões de brasileiros.
A pergunta que fica é: vamos continuar assistindo à seca consumir nossos rios ou finalmente tomaremos medidas concretas para garantir o futuro da água no Brasil?
*Com informações do MAPBIOMAS.
Para saber mais sobre o PANORAMA DA SUPERFÍCIE DE ÁGUA DO BRASIL 1985 – 2024, clique AQUI.