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Escrito por Neo Mondo | 18 de junho de 2025
Flexibilização do licenciamento ambiental: um ataque direto à vida da fauna silvestre - Imagem gerada por IA - Foto: Divulgação
ARTIGO
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Por - Natália Figueiredo*, especial para Neo Mondo
A flexibilização do licenciamento ambiental representa não apenas um retrocesso, mas um ataque direto à vida da fauna silvestre, aos ecossistemas, aos animais de criação e à saúde pública. Tudo isso será consequência do aumento do desmatamento, da poluição, da perda de biodiversidade e do risco de novas zoonoses, com a possível aprovação do vergonhoso PL 2.159/2021, mais conhecido como PL da Devastação.
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O Brasil, país que ocupa metade da América do Sul, é uma liderança em vida silvestre, com mais de 116 mil espécies animais, além de 46 mil espécies de plantas catalogadas — sem contar a variedade de fungos e bactérias. Vale lembrar que a devastação resultante dessa flexibilização pode atingir até espécies de outros países, considerando que 10% das aves encontradas em solo brasileiro são migratórias.
Para proteger esse inestimável patrimônio natural, antes da realização de obras ou atividades com potencial de causar significativa degradação ambiental, é indispensável o estudo prévio de impacto ambiental, conforme o art. 225, § 1º, inciso IV, da Constituição Federal de 1988. O levantamento da fauna é uma das etapas mais importantes, pois envolve vidas sencientes — ou seja, seres que, assim como os humanos, sentem dor, medo e angústia — que são diretamente afetadas toda vez que uma estrada, uma área de pasto ou uma hidrelétrica ocupa o espaço que antes era seu habitat e referência para localização de água e alimentação.
Nesse processo de identificação, conduzido por equipes multidisciplinares, são coletados dados sobre as mais variadas espécies. Para isso, utilizam-se diferentes métodos, sendo os mais conhecidos os registros fotográficos, a contagem visual, os sensores térmicos e a gravação de sinais acústicos. Em seguida, todas essas informações são rigorosamente avaliadas, e os pareceres técnicos emitidos pelos especialistas indicam os riscos para as espécies catalogadas, além de sugerirem possíveis ações de conservação.
Devido à relevância da preservação ambiental, um pouco antes da virada do milênio, a legislação brasileira deu um passo adiante ao instituir a Lei nº 9.985/2000, que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. O legislador foi objetivo ao detalhar, no art. 36, que, nos casos de licenciamento de empreendimentos considerados pelo órgão ambiental competente como causadores de significativo impacto ambiental — avaliação devidamente embasada pelo estudo de impacto ambiental e seu respectivo relatório (EIA/RIMA) —, o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de uma unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral, ou seja, uma área de preservação que não envolva consumo, coleta, dano ou qualquer tipo de destruição.
Todo esse cuidado que a nossa legislação ambiental teve, nas últimas décadas, ao tentar conciliar o chamado progresso com a preservação dos recursos naturais e das mais variadas formas de vida — o que, convenhamos, já pende desfavoravelmente para o agente afetado, neste caso, o meio ambiente — vai completamente por água abaixo se esse projeto for aprovado.
Por isso, este projeto sequer deveria retornar à discussão no Plenário da Câmara dos Deputados, e a Presidência da República poderia exercer sua prerrogativa de não pautá-lo, relegando a matéria aos porões da história. Infelizmente, o cenário é outro, e há grande possibilidade de aprovação final do texto pela Câmara. Assim, é urgente e necessário que o Executivo vete os dispositivos que trazem danos irreversíveis à biodiversidade, à saúde pública e à segurança climática do país. Entre eles, destacam-se: a dispensa de licenciamento para atividades agropecuárias e outros setores econômicos; o autolicenciamento automático, por meio da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), sem análise técnica prévia; e a fragmentação normativa, ao transferir a estados e municípios o poder de conceder dispensas, criando um cenário de insegurança jurídica.
Num país como o Brasil, que sofre com incêndios, secas e inundações, parece irônico que o projeto de licenciamento ambiental ignore a crise climática e restrinja a participação de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, ao enfraquecer os mecanismos de consulta e participação previstos na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
É dever do Poder Executivo proteger o meio ambiente como bem de uso comum do povo, conforme determina a Constituição Federal. O PL da Devastação é uma afronta a todos os seres vivos. Por isso, só nos resta aguardar o bom senso do veto, quando o momento chegar.
*Natália Figueiredo é Gerente de Políticas Públicas da Proteção Animal Mundial.
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