Francine Leal na in-cosmetics Global 2025, “Beleza, para ser sustentável, precisa ser também justa, rastreável e legal” – Foto: Divulgação
POR – OSCAR LOPES, PUBLISHER DE NEO MONDO
Diretora da GSS cobra responsabilidade real com a biodiversidade e expõe riscos de quem ainda finge que sustentabilidade é só marketing
Desde 1990, a in-cosmetics Global é o palco onde ciência, beleza e inovação se encontram para moldar o futuro do setor de cuidados pessoais. Tudo começou timidamente em Birmingham, na Inglaterra, com apenas 80 expositores. Hoje, a feira percorre o mundo — Paris, Seul, São Paulo, Bangkok — reunindo milhares de profissionais em busca das fórmulas que vão definir as próximas tendências. E, em 2025, em Amsterdam, não foi diferente.
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Só que, desta vez, além das novidades que brilham nos estandes e dos ingredientes exóticos com nomes quase impronunciáveis, uma fala ressoou diferente. E incomodou.
Francine Leal, diretora de Biodiversidade da GSS – Gestão Sustentável de Sistemas, tirou a plateia da zona de conforto com uma provocação certeira:
“A nova economia da natureza já começou. E quem não estiver preparado pode ficar para trás. E você?”
Quando a sustentabilidade deixa de ser marketing e vira responsabilidade
Com o auditório lotado na Zona de Sustentabilidade, Francine escancarou um abismo que poucos ousam admitir: o distanciamento entre o discurso sustentável que domina os estandes e o despreparo técnico real das empresas diante do Protocolo de Nagoya e da legislação brasileira de acesso e repartição de benefícios (ABS).
“Biodiversidade é essencial para o nosso negócio, não é? Mas, quando pergunto sobre o Protocolo de Nagoya ou sobre a repartição de benefícios, poucos têm algo concreto a dizer”, soltou, sem rodeios.
O recado foi claro: não dá mais para vender cosméticos limpos com processos sujos.
Compliance como estratégia — e não como obrigação
A apresentação de Francine mergulhou em dois pilares essenciais:
- A gestão da biodiversidade nas empresas, com foco nos riscos, nas dependências e nos impactos invisíveis;
- O marco legal brasileiro de ABS, alinhado ao Protocolo de Nagoya e às metas internacionais da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB).
Ela relembrou que o Brasil já regulamenta o acesso ao seu patrimônio genético desde 2000. E que, com a Lei 13.123/15, as empresas que utilizam ativos da biodiversidade brasileira têm deveres muito claros — inclusive no que diz respeito à repartição justa e equitativa dos benefícios com os detentores do conhecimento tradicional.
Francine ainda destacou duas metas da CDB como faróis éticos e estratégicos:
- Meta 13: implementar o Protocolo de Nagoya e reconhecer o valor dos povos tradicionais;
- Meta 15: avaliar e divulgar os riscos corporativos ligados à biodiversidade.
Soluções que saem do papel — e entram na fórmula
Na prática, como sair da inércia? Francine compartilhou a jornada da GSS na construção de um compliance robusto e efetivo, com ferramentas que traduzem a legislação em ação concreta:
- Avaliação minuciosa do portfólio de ingredientes com o suporte de especialistas;
- A premiada Plataforma Brogota, reconhecida pela ONU como inovação para rastreabilidade de ABS;
- Planilhas inteligentes que cruzam marketing, função e origem dos ingredientes;
- Cálculos precisos para repartição de benefícios com base na receita líquida dos produtos acabados;
- Apoio estratégico para regularização e adequação legal;
- A VBIO, uma vitrine de projetos validados para quem precisa direcionar seus investimentos sociais com responsabilidade.
O preço da omissão: riscos que ninguém quer pagar
A palestra também acendeu o alerta para os riscos operacionais, reputacionais e até financeiros de quem ignora a legislação:
“Uma casa de fragrância sobreviveria sem copaíba, tonka, pimenta-rosa ou álcool, caso seu uso fosse restringido por falta de compliance? E se uma praga atingir os plantios de carnaúba, espécie endêmica do Brasil, continuaremos com as melhores ceras do mercado?”
E concluiu: a blindagem da biodiversidade também é uma blindagem de negócios.
Segundo Francine, empresas que aplicam as diretrizes da TNFD (Taskforce on Nature-related Financial Disclosures) conseguem não apenas cumprir metas internacionais, mas garantir segurança financeira frente a um mundo cada vez mais atento à origem dos ingredientes.
Brogota: o futuro da rastreabilidade em tempo real
Ao final, o público conheceu o potencial da Brogota, uma plataforma que está redefinindo o jeito como empresas rastreiam seus ativos naturais e garantem sua conformidade com as leis. Não é só uma ferramenta — é um compromisso com o futuro.
E talvez o maior mérito da fala de Francine tenha sido justamente esse: trazer à tona o que muitos evitam discutir e lembrar que a beleza, para ser sustentável, precisa ser também justa, rastreável e legal.