PL 2.159/2021, o maior ataque à legislação ambiental desde 1988Imagem gerada por IA – Foto: Divulgação
POR – OSCAR LOPES, PUBLISHER DE NEO MONDO
Aprovado no Senado a menos de seis meses da conferência climática da ONU, projeto desmonta o licenciamento ambiental brasileiro. É o maior retrocesso desde a Constituição de 1988 — e um tapa de cinzas na cara do planeta
“Com licença, Natureza. Estamos só passando o trator.”
No exato momento em que o Brasil se prepara para sediar a COP30, conferência global sobre mudanças climáticas, o Senado decidiu dar ao mundo uma prévia do que podemos esperar: a aprovação do Projeto de Lei 2.159/2021, que desestrutura — com método e pressa — quatro décadas de proteção ambiental.
Com 54 votos a favor e 13 contra, o licenciamento ambiental, um dos principais instrumentos de controle e prevenção de impactos socioambientais, foi reduzido a um procedimento simplificado, autodeclaratório e vulnerável.
Agora, graças à chamada Licença por Adesão e Compromisso (LAC), empreendimentos de porte médio (e impactos nada pequenos) poderão ser licenciados sem análise técnica, sem estudos de impacto e — por que não? — sem culpa no cartório.
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Retrocesso com CNPJ e selo de urgência
O novo modelo parte de um princípio ousado: quem polui sabe o que está fazendo.
Na prática, isso significa que empresas poderão simplesmente declarar que cumprem a lei, como quem marca um checkbox na internet — e pronto: o licenciamento está aprovado.
E por que não confiar em quem abre crateras, altera cursos de rios e espalha pesticidas pelo ar?
Afinal, o Brasil é campeão mundial em fiscalização ambiental e transparência, certo?
❝O maior ataque à legislação ambiental desde 1988❞
A frase não é de ativistas radicais ou ongueiros exaltados. É da Transparência Internacional, que classificou o projeto como o pior retrocesso ambiental das últimas quatro décadas — um convite à degradação e à corrupção institucionalizada.
Para a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o PL é um atentado à Constituição e um risco à segurança ambiental e social do país:
“É incompatível com o que exige a Constituição. Desestrutura o arcabouço normativo que protege nosso patrimônio natural.”
E não para por aí. O projeto ignora completamente a crise climática.
Não menciona, não considera, não exige mitigação de emissões. Nada. Como se não estivéssemos vivendo incêndios recordes, escassez hídrica e colapsos de biodiversidade.
Paradoxo tropical: sede da COP30, laboratório da destruição
É difícil não se espantar com o timing da aprovação.
A COP30, que será realizada em Belém (PA), deveria ser a chance histórica do Brasil mostrar ao mundo que é possível liderar uma transição ecológica com justiça climática e governança socioambiental.
Mas ao aprovar o PL 2.159, o país optou por cavar mais fundo seu abismo moral, sinalizando aos negociadores internacionais que, por aqui, o meio ambiente continua sendo tratado como estorvo ao desenvolvimento — e não como base da economia do futuro.
O que dizem os cientistas?
- Carlos Nobre, climatologista e membro da Academia Brasileira de Ciências, alertou que o projeto “abre as portas para mais desmatamento e acelera o ponto de não retorno da Amazônia”.
- Mercedes Bustamante, ecóloga e professora da UnB, classificou o PL como “uma bomba-relógio para os biomas brasileiros”.
- Já o Observatório do Clima afirmou em nota:
“Ao flexibilizar regras e retirar exigências, o Congresso legaliza a destruição em série. É um cheque em branco para poluir e desmatar.”
O licenciamento virou cortesia da casa?
Aprovado em um Senado cada vez mais insensível à urgência climática, o PL 2.159 representa mais que um erro técnico: é uma aposta cínica na impunidade ambiental.
Uma vitória da pressa sobre o critério. Do lucro fácil sobre a responsabilidade coletiva.
E uma derrota profunda da ciência, da ética pública — e da própria democracia.
Reflexão final: licença para destruir
Que futuro esperamos construir com esse tipo de política?
Como pretendemos liderar a transição ecológica se desmontamos nossos próprios instrumentos de controle?
O Brasil, que poderia ser protagonista da sustentabilidade global, segue tropeçando nos mesmos fantasmas: ganância, desinformação e curadoria seletiva da realidade.
O PL 2.159/2021 não é apenas um projeto de lei.
É um sintoma do que acontece quando o país se distancia da ciência, da sociedade e de seu próprio dever constitucional.
A pergunta que fica é:
Será que ainda há tempo — e coragem — para revogar esse desastre anunciado?