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POR – OSCAR LOPES, PUBLISHER DE NEO MONDO
Neste 5 de junho, data emblemática em que celebramos o Dia Mundial do Meio Ambiente, o Portal NEO MONDO conversa com uma das vozes mais atuantes da agenda ESG no Brasil. À frente das estratégias socioambientais de uma das empresas mais admiradas do país, Luis Meyer, diretor de ESG do Grupo Boticário, nos conduz por uma jornada que conecta inovação, responsabilidade e regeneração.
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Numa época em que o Brasil recicla apenas 8% dos resíduos urbanos — segundo o Panorama dos Resíduos Sólidos 2024 — e enfrenta o desafio crônico do descarte inadequado, o compromisso da companhia com a economia circular e a educação ambiental ganha ainda mais relevância. De programas robustos de logística reversa a fragrâncias que denunciam a destruição ambiental, o Grupo Boticário se firma como um exemplo de que é possível transformar negócios em agentes de transformação.
Luis Meyer é diretor de ESG do Grupo Boticário, onde lidera uma estratégia ambiciosa pautada pelos ODS da ONU, unindo inovação tecnológica, responsabilidade social e sustentabilidade profunda. Sob sua liderança, o grupo tem promovido práticas de economia circular, desenvolvido embalagens inteligentes e estimulado o consumo consciente como base para um futuro regenerativo. Abaixo a entrevista completa.
Luis, o Boti Recicla está ativo desde 2006 e se tornou o maior programa de logística reversa do varejo de beleza no Brasil. O que mudou na mentalidade do consumidor e da indústria ao longo desses anos?
Desde 2006, quando o Boti Recicla começou, muita coisa mudou e, felizmente, para melhor. Lá no começo, falar de reciclagem no varejo de beleza era quase uma conversa isolada. Hoje, percebemos um consumidor cada vez mais consciente e atento, que busca escolher e valorizar marcas que têm responsabilidade ambiental.
Ao longo desses anos, vimos crescer um movimento coletivo de responsabilidade, desde a indústria, que passou a repensar seus processos, materiais e embalagens até o consumidor, que passou a ser parte ativa dessa transformação (sendo o principal elo para a circularidade, sem a destinação correta do resíduo pós consumo, o reaproveitamento e reinserção em novas embalagens fica limitada).
Sustentabilidade precisa ser uma prática consistente e não mais apenas um diferencial.
A Boti Recicla Store, que transforma resíduos recicláveis em moeda de troca, é uma ação inédita. Que mensagem essa iniciativa busca transmitir à sociedade? Ela representa uma virada na forma de comunicar a sustentabilidade?
A iniciativa foi criada com o objetivo de criar essa provocação sobre o consumo sustentável e engajar os consumidores a serem mais atuantes e responsáveis em suas escolhas de consumo.
Então essa iniciativa é uma forma diferente de conversar com as pessoas sobre reciclagem. Ela sai do discurso tradicional e convida para a ação, para a experiência. Em vez de só falar sobre impacto positivo, a gente mostra, na prática, que é possível gerar impacto positivo com atitudes simples do dia a dia.
Acreditamos que, sim, ela representa uma virada na forma de comunicar sustentabilidade, sendo mais participativa, mais acessível e mais próxima das pessoas. Além de mais participativa e acessível, a iniciativa também trouxe uma interação tecnológica diferenciada no processo de logística reversa na troca de embalagem por créditos, com uma balança hi-high-tech desenvolvida exclusivamente para a ação, que foi capaz de reconhecer o peso das embalagens que cada pessoa colocou nela e calcular quanto de CO2 foi economizado para o planeta a cada participação.
Inclusive a ação teve uma ótima receptividade do público. Nos três dias de operação, foram mais de 680 participantes contribuindo para a coleta de mais de uma tonelada de resíduos, evitando, aproximadamente, a emissão de mais de uma tonelada de CO₂.
A linha Arbo Puro utiliza resíduos de óleo de cozinha para criar tampas de frascos — uma solução surpreendente. Como vocês conciliam inovação técnica e responsabilidade ambiental em toda a cadeia produtiva?
A história da Arbo Puro é um ótimo exemplo de como a gente acredita que inovação e sustentabilidade não precisam e nem devem caminhar separadas.
A fragrância nasce do compromisso de aliar tecnologia de ponta a ingredientes que respeitam o meio ambiente. Da escolha de matérias-primas ao processo de fabricação, cada etapa foi pensada para reduzir impactos e valorizar ingredientes de origem natural.
Usar resíduos de óleo de cozinha nas tampas dos frascos é uma solução que surpreende, sim, mas que também carrega muito da nossa essência, de olhar para o que já existe e encontrar novas formas de fazer melhor.
Conciliar inovação técnica com responsabilidade ambiental é, pra gente, uma questão de escolha e prioridade. Desde o desenvolvimento das fórmulas até as embalagens e a logística, buscamos integrar sustentabilidade de ponta a ponta. Isso exige pesquisa, colaboração com fornecedores e escuta ativa do consumidor.
Através da abordagem de balanço de massa, essa iniciativa reduz não só o consumo de plástico obtido a partir do petróleo, como também as emissões de gases de efeito estufa, pois a tampa emite 51%* menos dióxido de carbono (CO2) equivalente.
É um desafio constante, mas é também o que nos move. Porque inovar, pra gente, é criar produtos que façam bem não só pra quem usa, mas também pro mundo em que a gente vive.
O projeto “Extinto” recria fragrâncias inspiradas em ecossistemas ameaçados. De que forma a emoção e a arte podem sensibilizar o público mais profundamente que a razão? A beleza pode ser uma linguagem de alerta?
A gente acredita profundamente que a emoção tem um poder de transformação que a razão, sozinha, muitas vezes não alcança. O projeto Extinto nasce justamente desse lugar, de provocar sensações, memórias, reflexões através da arte e da beleza.
Quando a gente recria fragrâncias inspiradas em ecossistemas ameaçados, estamos convidando as pessoas a sentir o que pode desaparecer. É uma forma de tornar o problema mais próximo, mais humano. Porque não é só sobre dados ambientais ou estatísticas de desmatamento. É sobre cheiro, sobre história, sobre perda sensorial. E isso toca em outro lugar.
A beleza, nesse contexto, vira sim uma linguagem de alerta. Mas é um alerta sensível, que não impõe, convida. E quando conseguimos esse tipo de conexão, a mudança de consciência vem de um jeito mais profundo e verdadeiro.
O Boticário tem repensado suas lojas físicas com foco em design ecológico e uso de resíduos de baixa reciclabilidade. Como esses espaços podem ser agentes de transformação no ponto de venda?
Quando a gente repensa o espaço físico da loja com design ecológico e materiais de alta reciclabilidade, estamos indo além da estética, fazemos do ponto de venda um ponto de conversa, de conscientização.
Esses espaços passam a contar uma história, seja de reaproveitamento, inovação ou cuidado. E isso transforma a experiência de quem entra ali. A pessoa não está só comprando um produto, ela está vivenciando, mesmo que sem perceber, uma nova forma de consumir e de se relacionar com o ambiente.
A loja vira um espelho do que a marca acredita. E mais do que isso, vira um convite para que cada um pense no impacto das suas escolhas. No fim de 2024, foi inaugurada a centésima loja sustentável, totalizando mais de 100 toneladas de plástico reciclado nas suas estruturas. Esse modelo é projetado para ser 50% mais leve e 40% mais eficiente termicamente em comparação aos contêineres tradicionais, contribuindo ainda para a redução de consumo de energia.
Além disso, a marca também desenvolveu, junto à Mão Colorida, a chapa sustentável, um material que substitui o MDF no mobiliário das lojas e é produzido com resíduos de baixa reciclabilidade.
E olhando para o futuro: qual o maior legado que uma empresa de beleza pode deixar para além do consumo — especialmente em tempos de emergência climática e colapso ambiental?
Acredito que o maior legado que uma empresa de beleza pode deixar vai muito além do produto na prateleira. Em tempos de emergência climática, o verdadeiro impacto está em como a gente usa nossa voz, nossa escala e nossa criatividade para inspirar novos comportamentos e construir pontes entre autocuidado e cuidado com o planeta.
A beleza tem esse poder de conexão com as pessoas. Ela toca autoestima, identidade e afeto, e quando essa conexão é usada para provocar reflexão, incentivar escolhas mais conscientes e apoiar causas urgentes, ela se transforma em ferramenta de transformação.
Para nós, valor vai além do que se ganha, é também o que se deixa de legado. Cuidar das pessoas, da natureza, das relações. Se conseguirmos deixar um caminho mais leve, mais justo e mais sustentável para quem vem depois, esse será, sem dúvida, o nosso maior legado.
O Grupo Boticário tem seus compromissos públicos em sua plataforma de sustentabilidade, além de ser mantenedor da Fundação Grupo Boticário, que é pioneira na agenda ambiental, comemorando 35 anos em 2025.
Luis, o Brasil é hoje um país no centro das atenções climáticas globais, especialmente com a chegada da COP30. Nesse contexto, que papel empresas com alcance nacional e influência cultural, como o Grupo Boticário, devem assumir na criação de um pacto regenerativo e socialmente justo?
Com a chegada da COP30 e os olhos do mundo voltados para cá, temos uma chance única de mostrar que é possível liderar uma agenda climática com responsabilidade.
Empresas como o Grupo Boticário, que têm capilaridade, voz e conexão com milhões de pessoas, têm um papel que vai muito além do setor de beleza. A gente precisa e quer ser parte ativa da construção de um pacto regenerativo. Isso significa olhar para toda a cadeia: da matéria-prima à loja, das embalagens aos territórios onde atuamos, das decisões internas ao impacto coletivo.
Mais do que mitigar danos, é hora de reconstruir e isso só acontece quando unimos inovação, compromisso ambiental e responsabilidade social. A influência cultural que temos pode e deve ser usada para inspirar mudanças, abrir diálogos e mobilizar ações.
A estratégia de ESG do Grupo Boticário é guiada pelos Compromissos para o Futuro, lançados em 2021 e alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Ao todo, são oito compromissos distribuídos em sete temáticas: Mudanças Climáticas, Resíduos, Água, Biodiversidade, Diversidade e Inclusão, Desenvolvimento Social e Fornecimento Sustentável.
“Para nós, valor vai além do que se ganha, é também o que se deixa de legado. Cuidar das pessoas, da natureza, das relações. Se conseguirmos deixar um caminho mais leve, mais justo e mais sustentável para quem vem depois, esse será, sem dúvida, o nosso maior legado” — Luis Meyer.
Luis Meyer é Mestre em Administração pela Universidade Positivo (2015), possui MBA em Gerenciamento de Projetos pelo ISAE/FGV (2011), Especialização em Finanças pela PUC-RS (2019 – em andamento) e Graduação em Engenharia de Produção pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2009).