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ARTIGO
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Por – Dra Marcela Baraldi*, articulista de Neo Mondo
Na interseção entre ética, ciência e estética, uma revolução silenciosa está ganhando forma — e transformando profundamente a maneira como enxergamos a beleza no século XXI. Os cosméticos veganos e cruelty-free não são apenas uma tendência: representam um novo modelo de consumo baseado em respeito à vida, responsabilidade ambiental e escolhas conscientes.
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Impulsionado por consumidores atentos e engajados, esse movimento tem redefinido padrões em laboratórios, consultórios e prateleiras. O desejo por fórmulas livres de crueldade animal e livres de ingredientes de origem animal cresce em paralelo à exigência por transparência, eficácia e inovação. A beleza, hoje, é também uma expressão de valores.
Cruelty-free e vegano: entenda a diferença
Embora caminhem juntos, os dois conceitos têm definições distintas. Produtos cruelty-free são aqueles que não realizam testes em animais em nenhuma etapa do desenvolvimento. Já os produtos veganos vão além, excluindo qualquer ingrediente de origem animal em sua composição, como cera de abelha, colágeno, lanolina ou carmim.
Essa consciência ética, embora pareça recente, começou a ganhar forma ainda nos anos 1970 com os primeiros movimentos pelos direitos dos animais, que questionaram o uso de cobaias em testes laboratoriais. Hoje, ela está consolidada como um pilar de inovação e responsabilidade na indústria cosmética.
Ciência e inovação a serviço da beleza ética
Tecnologia e pesquisa têm sido aliadas essenciais no desenvolvimento de cosméticos que respeitam a vida. Graças à bioengenharia, à química verde e aos testes alternativos, é possível formular produtos mais eficazes, seguros e sustentáveis.
O ácido hialurônico biotecnológico, por exemplo, é um avanço que une performance superior a uma pegada ética e ambiental mais leve. Ingredientes antes exclusivos do reino animal agora ganham equivalentes vegetais ou sintéticos — com benefícios muitas vezes ampliados.
Desafios e nuances no caminho da beleza ética
Mesmo com tantos avanços, alguns obstáculos ainda exigem atenção:
- Ausência de regulamentação global: Não há ainda uma norma internacional que padronize os selos “vegano” ou “cruelty-free”. Isso abre espaço para o greenwashing — uso indevido de rótulos sem comprovação.
- Substituição de ingredientes tradicionais: Ingredientes como colágeno e lanolina têm alta eficácia dermatológica. Suas substituições vegetais ainda enfrentam barreiras técnicas de desempenho, estabilidade e compatibilidade com todos os tipos de pele.
- Métodos alternativos de testes: Testes in vitro e in silico são promissores, mas ainda não abrangem toda a complexidade das reações em organismos vivos.
- Confusões conceituais: Nem todo produto vegano é natural ou sustentável. Um cosmético pode ser vegano e, ainda assim, conter derivados petroquímicos. Por isso, ler rótulos e buscar informações confiáveis é essencial para o consumo consciente.
Um horizonte de oportunidades para a indústria e para a sociedade
Apesar dos desafios, a beleza ética abre caminhos transformadores:
Inovação responsável: O interesse por cosméticos éticos tem impulsionado o surgimento de novos ingredientes botânicos, biotecnológicos e sintéticos com menor impacto ambiental.
Mercado mais consciente: Consumidores exigem transparência, e as marcas que abraçam essa responsabilidade estão conquistando confiança e fidelidade.
Contribuição real aos ODS da ONU: A beleza vegana contribui diretamente com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em especial os de saúde e bem-estar (ODS 3), consumo responsável (ODS 12), vida na água (ODS 14) e vida terrestre (ODS 15).
Valorização profissional: Profissionais que compreendem essa nova lógica — como dermatologistas, esteticistas, farmacêuticos e formuladores — se destacam por alinharem conhecimento técnico com valores humanos.
A ascensão da beleza vegana e cruelty-free representa mais do que uma escolha estética: é uma escolha civilizatória. Trata-se de colocar a ciência, a ética e a sustentabilidade a serviço do bem-estar — da pele e do planeta.
As marcas que entenderem essa mudança de paradigma não estarão apenas inovando em seus laboratórios, mas também contribuindo para uma cultura de cuidado mais ampla, mais empática e mais alinhada com os desafios do nosso tempo.
Porque, no fim das contas, não há beleza que valha à custa do sofrimento — e sim, uma nova estética possível: aquela que protege, respeita e transforma.
Referências:
- OECD (2018). Good In Vitro Method Practices (GIVIMP).
- Lima, D.A. et al. (2020). Cosméticos veganos: aspectos legais, funcionais e de mercado. Revista Fitos, 14(1): 57-66.
- United Nations. Sustainable Development Goals (SDGs) – https://sdgs.un.org/goals
*Dra Marcela Baraldi, Médica Dermatologista, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, cadastrada no corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein e consultório particular – CRM: 151733 / RQE: 66127.